Ponte Rio-Niterói faz 50 anos e continua sendo uma das maiores obras de engenharia do mundo
Engenheiro que atuou na construção da ponte conta sobre os desafios do projeto e obras de manutenção
A data histórica de 4 de março de 1974 marca a inauguração da Ponte Rio-Niterói, que completou 50 anos neste ano, continua sendo a maior ponte do Hemisfério Sul e a 23a no ranking mundial. É, sem dúvida, uma das maiores obras de engenharia do mundo sob o ponto de vista estrutural e arquitetônico.
Referência mundial na área de manutenção de grandes pontes, sua estrutura continua sendo debatida. Durante o XV CBPE – Congresso Brasileiro de Pontes e Estruturas, promovido em maio pela ABECE e ABPE, o engenheiro Carlos Henrique Siqueira abordou o tema “Ponte Rio-Niterói: o cenário das juntas de dilatação em 50 anos de história”.
Siqueira é a memória viva da história da ponte. Ele iniciou sua carreira como engenheiro contratado para integrar a equipe, formada por cem engenheiros. “Eu estava fazendo pós-graduação quando me convidaram para trabalhar na construção da ponte. Depois de inaugurada, continuei como responsável técnico pela manutenção e depois, no regime de concessão, fui contratado como consultor. A ponte fez 50 anos de inauguração e faz 52 anos que trabalho nela”, comemora.
Desafios do projeto
Com essa trajetória, Siqueira relembra os desafios do projeto, que iria encurtar a distância entre Rio de Janeiro e Niterói. Antes da construção, era necessário percorrer a Baía de Guanabara, num percurso de 100 quilômetros. “A construção começou em 1969 e, na minha visão, duas situações foram as mais desafiadoras: as construções das fundações profundas num trecho da Baía da Guanabara e a montagem do caixão metálico”, ressalta.
Um dos dados que tornam essa obra única é que a laje do vão central, por onde passam os veículos, está apoiada em tubulões das fundações em rochas sãs localizadas a 130 metros de profundidade. “Isso é espetacular. Temos 1.138 tubulões e o mais profundo deles tem uma coluna contínua de concreto de 130 metros. Isso foi realmente na minha visão, um dos maiores desafios”.
Outro desafio foi a montagem da estrutura metálica que, para aquela época, foi a maior do mundo, de acordo com as revistas técnicas internacionais. O governo brasileiro comprou da Inglaterra 13.155 toneladas de aço e, quando chegaram os painéis, foi feita a soldagem e construídos os caixões metálicos na base naval da Ilha do Caju. “Ficamos conhecidos internacionalmente por essa montagem”, relembra.
Números grandiosos
Tudo que diz respeito à Ponte Rio-Niterói é grandioso. A ponte tem o maior vão em viga reta contínua do mundo, com 300 metros de comprimento. “Ainda é o maior vão central do mundo e esse recorde provavelmente não será batido, porque não se faz mais pontes similares”, ressalta o engenheiro.
Segundo Siqueira, esse vão de 300 metros é o principal canal de navegação, além de dois canais de navegação adjacentes de 200 metros.
Ele detalha que a ponte no trecho sobre o mar tem pilares de concreto com 20 metros e vai chegando perto do vão central com pilares de 65 metros, conforme exigência da Aeronáutica na época.
Confira outros dados impressionantes da Ponte Rio-Niterói
– 1.142 vigas nos acessos Rio e acessos Niterói;
– 3.250 aduelas, que compõem a superestrutura sobre a baía de Guanabara;
– 456 é o número de pilares na ponte, sendo que 206 estão no mar;
– 75 mil m3 é a quantidade de concreto submerso no trecho sobre o mar;
– 238 mil toneladas de cimento foi a quantidade utilizada na construção, o que daria uma altura superior a 2 mil vezes o Pão de Açúcar considerando o saco de cimento empilhado;
– 10.000 operários trabalharam na construção;
– 200 engenheiros atuaram na construção;
– 180 mil veículos trafegam diariamente pela ponte;
– 1ª obra no Brasil a ter Manual de Inspeção.
Referência mundial em manutenção
A Ponte Rio-Niterói continua sendo uma referência porque, ao longo de seus 50 anos, sua estrutura foi cuidadosamente mantida, sendo inclusive alvo de curiosidade para o mundo e, para se ter uma ideia, diversas delegações internacionais a visitam constantemente.
Siqueira inclusive é professor convidado do governo chinês para Vistoria de Pontes e relata que em 2004 recepcionou os engenheiros chineses em sua visita técnica. “Eles queriam verificar como a gente protegia a ponte contra impactos de navios. Outras comitivas vêm ao Rio, como os alunos de Engenharia de Munique, para visitar a ponte em sua conclusão de curso”, relata.
Leia também: Como a ponte Rio-Niterói superou o impacto de um navio
Melhorias contínuas
O engenheiro informa que a ponte passa por melhorias contínuas, fazendo recuperações modernas que são referência no mundo todo. Ele conta que nos anos 2000 o asfalto do vão central foi substituído por um piso de concreto armado, com duas camadas de aço. “Isso resolveu definitivamente o problema de abertura de buracos na pista, que causavam acidentes e problemas para a estrutura metálica das soldas”, aponta.
Atualmente, ele conta que os técnicos estão reforçando toda a ponte, com cabos de proteção adicional. Longe de ter qualquer situação de colapso, o fato é que o aço usado na época apresentava relaxação (perda gradual de tensão quando o material está em um estado de deformação constante). “Agora, estamos colocando cabos de aço que não têm relaxação tão alta para compensar a perda de tensão que os cabos estavam sofrendo”, observa Siqueira.
Além disso, estão sendo reforçadas as aduelas de concretos e feitas pinturas dos caixões metálicos devido à ambiência agressiva da Baía de Guanabara. “Fazemos uma série de monitorações nas estruturas metálica e de concreto e estamos trocando as juntas de dilatação no pavimento. São serviços dispendiosos, mas que garantem a manutenção da parte estrutural. É por isso que a ponte continua sendo referência mundial”, conclui ele.
Entrevistado
Carlos Henrique Siqueira é engenheiro civil formado pela Universidade Federal da Paraíba. Pós-graduado em Estruturas na Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Mestre e Doutor em Ciências pela Universidade Federal Fluminense (UFF). Engenheiro da Supervisão da Construção e da Manutenção da Ponte Rio-Niterói há mais de 40 anos. Professor do Instituto Nacional de Estruturas Protendidas (INAEP), professor convidado do governo chinês para Vistoria de Pontes e do curso de Mestrado na disciplina “Inspeção, manutenção e recuperação de pontes” pela Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ). Consultor da Concessionária da Ponte Rio-Niterói (Ecoponte). Diretor da ABPE (Associação Brasileiras de Pontes e Estruturas).
Contato: carloshsiqueira@yahoo.com.br
Jornalista responsável
Ana Carvalho
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