Novela lembra 20 anos do Palace II: o que é mito, o que é verdade?

Versão sobre uso de areia de praia não é verdadeira. O que ocorreu foi que a execução dos pilares não atendeu cálculos do projeto

Escombros do Palace II: vinte anos depois, mito do uso de areia de praia ainda alimenta teses sobre o desabamento do edifício. Crédito: Arquivo Público
Escombros do Palace II: vinte anos depois, mito do uso de areia de praia ainda alimenta teses sobre o desabamento do edifício. Crédito: Arquivo Público

Na novela Segundo Sol, em exibição pela Rede Globo no horário das 21h, o personagem Severo Athayde é um empreiteiro que cai em desgraça quando parte de um edifício construído pela sua empresa desmorona e causa mortes. As investigações na ficção concluem que o prédio usou areia de praia na concretagem das estruturas.

A boa engenharia proíbe o uso de areia da praia como agregado do concreto. Ela contém grande quantidade de sais, como o sódio, que aumentam o risco de corrosão das ferragens dentro do concreto, além de modificar o tempo de pega do cimento, a velocidade de endurecimento e valores como resistência, durabilidade e elasticidade da estrutura.

Obviamente, a novela faz referência a uma tragédia que ocorreu há 20 anos, no Rio de Janeiro-RJ. Em 22 de fevereiro de 1998, desabava o edifício Palace II, que resultou na morte de oito pessoas. O folhetim explora a versão popular sobre o desabamento da edificação, de que teria sido usada areia de praia na produção do concreto estrutural do prédio, o que é mito.

O real motivo é que 31 dos 42 pilares foram executados segundo um projeto com falhas e subdimensionados, de tal forma que em vez de suportarem 480 toneladas cada um, estavam calculados para no máximo 230 toneladas. Resultado: os pilares não suportaram a edificação de 23 andares, que acabou desabando.

Essa é a versão oficial que consta no inquérito sobre a queda do edifício Palace II, após perícia realizada durante as investigações a respeito das causas do desabamento. Diz o laudo técnico: “Houve erro generalizado no dimensionamento dos pilares, principalmente erro gravíssimo nos pilares P4A e P44A, sobre os quais o edifício desabou.”

Coeficiente mínimo do concreto usado nos pilares não atendia a ABNT NBR 6118

A perícia também confirma que 31 dos 42 pilares estavam abaixo do coeficiente mínimo de segurança exigido pelas normas técnicas da Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT), em especial a ABNT NBR 6118 – Projeto de Estruturas de Concreto: Procedimento. O laudo técnico é assinado por quatro peritos do Instituto Carlos Éboli e feito em parceria com o Instituto Nacional de Tecnologia e o departamento de engenharia civil da PUC-RJ.

O Palace 2 teve dois desmoronamentos: o primeiro ocorreu às 3h do dia 22 de fevereiro de 1998, com a queda das colunas 1 e 2 do prédio, onde havia 44 apartamentos, matando oito pessoas. No dia 24 de fevereiro, a prefeitura da cidade do Rio de Janeiro anunciou a implosão do edifício para o dia 29. No entanto, dia 27 aconteceu outro desmoronamento, destruindo 22 apartamentos.

A implosão foi antecipada para o dia 28 de fevereiro de 1998, que pôs abaixo a totalidade do prédio, que tinha 176 apartamentos. O Palace II foi construído em 1990 pela construtora Sersan, que pertencia ao então deputado federal Sérgio Naya – morto em 2009. Em 2014, no mesmo terreno, foi construído o edifício Marapendi, dentro do condomínio Barra One. O novo prédio abriga 180 apartamentos.

Na época da tragédia, 120 dos 176 apartamentos estavam ocupados. As famílias prejudicadas receberam 1/4 das indenizações devidas pela construtora Sersan, responsável pela obra. Até hoje, através da Associação das Vítimas do Palace II, elas tentam, na Justiça, receber o que lhes é devido.

Entrevistado
Reportagem com base no laudo técnico sobre o desabamento do edifício Palace II, que consta no Instituto Brasileiro de Ciências Criminais

Contato: ibccrim@ibccrim.org.br

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330


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