Negligência é a principal patologia das barragens
Especialista alerta que estruturas devem ser monitoradas constantemente, o que muitas vezes não ocorre na prática, principalmente no Brasil
Especialista alerta que estruturas devem ser monitoradas constantemente, o que muitas vezes não ocorre na prática, principalmente no Brasil
Por: Altair Santos
Todo ano, em média, ocorrem de 3 a 4 acidentes com barragens no mundo. A probabilidade de rompimento é maior que a queda de aviões de grande porte. Os dados são do US Army Corps of Engineers (USACE, da sigla em inglês para Corpo de Engenheiros dos Estados Unidos). O organismo é responsável por monitorar e fiscalizar as quase 90 mil barragens que existem no país e dispõe de um orçamento anual de US$ 4,6 bilhões (quase R$ 15 bilhões) para fazer o gerenciamento das construções.
Segundo informações trazidas pelo professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR), José Lucas Sobral Marques, no 1º Simpósio Paranaense de Patologia de Construções (SPPC), os Estados Unidos possuem também as mais eficientes leis sobre controle de barragens. Tanto é que serviram de inspiração para que o Brasil criasse a 12.334/10, que estabeleceu a política nacional de segurança de barragens. Até 2010, o país não tinha uma legislação específica sobre o tema. Mesmo assim, ela não foi capaz de impedir a tragédia que ocorreu em Mariana-MG, em novembro de 2015.
O Brasil, no entanto, não é o país mais vulnerável a rompimento de barragens. Antes de Mariana-MG, a maior tragédia ocorreu em 1960, em Orós, no Ceará, quando a estrutura construída no município rompeu durante o período de enchimento e provocou mil mortes. Nada comparado, porém, ao rompimento da barragem de Vajont, na região dos Alpes italianos, em 1963, e que deixou um saldo oficial de 1.917 mortos. Construída em 1960, a obra deu vários sinais de que tinha problemas, e que foram ignorados.
Obras eternas
De acordo com o professor José Lucas Sobral Marques, a negligência é fator determinante para o rompimento de barragens. “Nove em cada dez rompem por negligência ou falta de comunicação entre projetista, construtora e empreendedor”, alerta. O especialista destaca ainda que, por isso, é tão importante fazer a análise de risco do início ao fim do projeto de construção de uma barragem. “Neste tipo de obra, mais do que nunca, vale a máxima da construção civil: nenhum projeto está livre de risco, que podem ser gerenciados, minimizados, compartilhados, transferidos ou aceitos, mas jamais ignorados”.
O engenheiro civil destaca que ao longo da vida útil de uma barragem existe um processo contínuo pela qual elas devem passar, e que envolve identificação de problemas, medição, monitoramento e comunicação. “Isso independe da tecnologia usada para a construção”, afirma. No caso das barragens com estrutura em concreto, esses cuidados devem ser ainda mais intensos. “As barragens de concreto se submetem a variáveis maiores, o que demanda mais cuidados. A começar por um rigoroso estudo topográfico e do solo, para ver se aquela geologia aceita concreto. Em seguida, a atenção deve se voltar para o projeto, o controle tecnológico do concreto e a qualificação da mão de obra”, destaca.
José Lucas Sobral Marques lembra ainda que barragens de concreto devem ser projetadas com fck (resistência do material) muito acima do que convencionalmente se trabalha. “Estamos falando de estruturas superdimensionadas, e que devem ser projetadas para durar séculos. Hidrelétricas como Três Gargantas, na China, e Itaipu, no Brasil, são obras praticamente eternas. Felizmente, a engenharia hoje está cada vez mais habilitada tecnologicamente para mantê-las intactas”, finaliza.
Entrevistado
Engenheiro civil José Lucas Sobral Marques, professor da Universidade Federal do Paraná (UFPR) para o curso de graduação de engenharia civil e especialista em barragens, tendo como orientador o professor-doutor José Marques Filho
Contato: petcivilufpr@gmail.com
Créditos Fotos: Divulgação/PetCivil-UFPR/Arquivo Nacional da Itália
Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330
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