NBR 15575 impõe novos desafios à construção civil
Norma de desempenho de edifícios entra em vigor em maio e mexerá com toda a cadeia produtiva do setor
Norma de desempenho de edifícios entra em vigor em maio e mexerá com toda a cadeia produtiva do setor
Em 12 de maio entra em vigor, no Brasil, a NBR 15575 (partes 1 a 6) conhecida como a norma brasileira de desempenho de edifícios. Ela estabelece o desempenho mínimo obrigatório para alguns sistemas, ao longo da vida útil de um empreendimento. Com isso, há a expectativa no meio técnico de que sua aplicação possa mudar a forma como as habitações brasileiras passarão a ser construídas. Mas a pergunta que mexe com o setor é a seguinte: o que de fato a norma pode trazer de novo para a construção civil e qual o impacto que sua adoção pelas construtoras pode acarretar nos processos construtivos?
A principal característica da NBR 15575 – Edifícios habitacionais de até cinco pavimentos Desempenho é que ela foi concebida com base no conceito de desempenho, diferentemente do arcabouço normativo brasileiro, que está baseado em prescrição. A mudança é que a abordagem de desempenho está preocupada com os resultados que um edifício ou sistema deve atingir quando em utilização (comportamento em uso) e não com a forma com que foi construído.
A pretensão da Norma de Desempenho foi traduzir tecnicamente as necessidades dos consumidores brasileiros de imóveis, levando em conta o estágio técnico e sócio-econômico do Brasil. Foi definido um desempenho mínimo obrigatório para alguns sistemas (estruturas, pisos internos, paredes e vedações, coberturas e sistemas hidrossanitários), seguindo as diretrizes da ISO 6241 de 1984, que define requisitos de desempenho.
Alguns destes requisitos são: segurança estrutural, segurança contra incêndio, desempenho térmico, acústico, de iluminação, de manutenção, conforto tátil e antropodinâmico. A estrutura da norma está baseada nos requisitos que são quantitativos e nos métodos de avaliação que permitem mensurar o atendimento ou não do desempenho.
Do ponto de vista prático, o principal impacto para as construtoras está na necessidade de uma nova metodologia de projeto. O desempenho de um sistema ou edifício tem que ser resolvido no nível do projeto, que responde por mais de 50% do desempenho de uma obra. É importante salientar que o desempenho de um edifício ou dos sistemas que o compõem depende de uma série de agentes, que vão desde os incorporadores, construtores, projetistas, fabricantes de materiais, até os administradores pós-obra. Neste caso, todos os agentes do setor da construção civil são sócios do desempenho, querendo ou não.
É sobre as mudanças práticas da NBR 15575 que a engenheira Maria Angélica Covelo, diretora da NGI Consultoria, fala na entrevista abaixo. Ela explica, por exemplo, que não se trata de uma padronização das obras, mas que, independentemente do sistema construtivo, alguns requisitos passam a ser obrigatórios desde a concepção do projeto. Confira:
A Norma de Desempenho NBR 15575 entra em vigor em maio. O que ela vai mudar para o consumidor que busca comprar um imóvel?
Em resumo, o consumidor terá direito a comprar um imóvel que atenda requisitos de comportamento em uso dos edifícios, com respeito a itens relacionados à segurança, à habitabilidade e à sustentabilidade. Na prática, se pretende evitar que as construções fiquem menos expostas a problemas estruturais, tenham maior proteção contra incêndio e sejam mais fáceis de receber operações de manutenção.
Para os construtores, o que muda?
As empresas incorporadoras e construtoras passam a ser responsáveis por assegurar que os empreendimentos atendam a estes requisitos e, para tanto, precisarão introduzir novas práticas de projeto, de especificações e escolha de materiais e sistemas construtivos, de seleção de fornecedores, de execução das obras e de instruções de uso e manutenção.
Trata-se de uma medida para padronizar as construções?
Não. A metodologia de desempenho não estabelece como se deve atingir estes requisitos. Na metodologia de desempenho, o que importa é que os materiais, componentes e sistemas construtivos sejam caracterizados quanto à sua capacidade de atender aos requisitos de desempenho. Cabe aos projetistas, construtores e fabricantes comprovarem que o resultado final, seja qual for o sistema construtivo, é capaz de atender os requisitos estabelecidos ao longo da vida útil do edifício. O padrão que se estabelece é que um edifício, seja de que sistema construtivo for, precisa atender aos requisitos mínimos estabelecidos pela norma.
A nova norma vai encarecer as construções?
Nos requisitos em que, até hoje, trabalhamos abaixo de um mínimo aceitável pelos padrões internacionais, como é o caso do desempenho acústico, talvez tenhamos custos a mais. Mas isso se deve ao fato de que trabalhamos em níveis de desempenho inadequados e agora, para adequar, haverá esta consequência. Para outros itens, as empresas que já trabalham atendendo as normas prescritivas existentes não terão custos a mais. Já aquelas que não atendem normas, que trabalham com padrões construtivos muito abaixo dos níveis de desempenho mínimo da norma, terão acréscimo de custo para chegar ao que exige a norma.
Sob o ponto de vista jurídico, quem não cumprir a norma está sujeito a que tipo de pena?
O Código de Defesa do Consumidor estabelece que nenhum produto ou serviço pode ser colocado no mercado sem atender às normas técnicas pertinentes. Quem não cumprir fica sujeito aos encargos decorrentes do não atendimento deste artigo do código, dependendo do julgamento de cada situação.
Quem vai fiscalizar o cumprimento da norma?
Nenhuma norma brasileira é fiscalizada por algum órgão, a não ser as normas do Ministério do Trabalho, da Anvisa e outras agências regulatórias do governo. As normas técnicas não são leis. Funcionam como lei apenas aquelas que estão vinculadas às leis, como é o caso da norma de acessibilidade (NBR 9050), que é vinculada a um decreto de lei federal de 2004. A força de lei, em função do Código de Defesa do Consumidor, faz com que o maior fiscal de seu cumprimento seja o consumidor, que tem o direito de exigir seu cumprimento. Exigências serão posteriormente feitas por instituições financeiras, como a Caixa Econômica Federal, que já está exigindo o cumprimento da norma por parte de sistemas inovadores, através do SINAT (Sistema Nacional de Aprovações Técnicas).
Por que surgiu a necessidade de se criar a norma: havia muita diferença de uma obra para outra?
A necessidade da norma veio da falta de parâmetros para avaliar sistemas, componentes e materiais que fossem inovadores (não consagrados pelo uso), e que só podiam ser avaliados por requisitos de desempenho que não existiam no Brasil. Em países desenvolvidos, norma de desempenho semelhante à NBR 15575 já existem desde o início dos anos 80.
A norma abrange apenas construções residenciais ou envolve também edificações industriais?
A norma publicada abrange apenas edifícios residenciais. Num segundo momento serão elaboradas normas equivalentes a esta para outros tipos de obras.
Por que ela se refere apenas a edificações de 5 pavimentos? Se for feito um edifício de 10 andares, a norma é outra?
Existem requisitos de desempenho que são dependentes da altura do edifício e outros que não dependem. A norma tem uma nota que diz claramente que os requisitos que não dependem de altura são aplicáveis a edifícios de mais de cinco pavimentos. Ainda será elaborada uma norma complementar para os requisitos que dependem de altura. Mas o construtor não deve deixar de aplicar requisitos que independem da altura em edifícios de mais de cinco pavimentos. O foco principal da norma foi esse: priorizar edifícios de empreendimentos do segmento econômico.
A partir da vigência da norma, as edificações habitacionais brasileiras vão se equiparar a padrões internacionais ou elas hoje já têm qualidade comparável a de outros países?
Em alguns requisitos já temos níveis adequados aos padrões internacionais de países desenvolvidos, como, por exemplo, na segurança estrutural. A norma NBR 6118, que é a norma de projeto de estruturas de concreto, já é baseada em requisitos de desempenho estrutural e o Comitê ISO/TC71/SC4 (Performance Requirements for Structural Concrete) aprovou nossa norma como norma de padrão internacional e ela faz parte da ISO 19338, podendo ser utilizada por projetistas fora do Brasil. Em outros requisitos estamos muito aquém dos países desenvolvidos, como é o caso do desempenho acústico de edifícios.
Obras do programa Minha Casa, Minha Vida começaram antes de a norma entrar em vigor. Como ficam essas construções que não seguem as novas regras?
O governo perdeu uma grande oportunidade de melhorar a qualidade das edificações habitacionais ao definir os padrões do Minha Casa, Minha Vida fora dos padrões da norma que ainda não estava em vigor, mas estava publicada. Itens como o pé-direito mínimo aceito pelo Programa (de 2,40 m) comprometem o desempenho térmico, por exemplo, (a norma define um mínimo de 2,50 m). Mas como a norma não estava em vigor o consumidor não poderá fazer nada quanto a isso. O consumidor só poderá exigir que atendam os requisitos os empreendimentos cujo projeto tenha sido protocolado para aprovação nas prefeituras após seis meses depois de ela entrar em vigor (12 de novembro, já que ela entra em vigor em 12 de maio).
Quem é a entrevistada
Maria Angélica Covelo Silva é engenheira civil pela Universidade Estadual de Londrina (PR), mestre em engenharia pela Universidade Federal do Rio Grande do Sul e doutora em engenharia pela Escola Politécnica da Universidade de São Paulo. Também é diretora da NGI Consultoria e Desenvolvimento, em São Paulo.
Email da entrevistada: ngi@ngiconsultoria.com.br
Site: www.ngiconsultoria.com.br
Jornalista Responsável Altair Santos MTB 2330 Vogg Branded Content
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