Laboratório brasileiro planeja imprimir cozinha com tecnologia 3D
Projeto do hubIC desenvolve soluções para viabilizar técnica e o uso de 3D na construção
A impressão em três dimensões na construção civil vem ganhando cada vez mais espaço no Brasil e no mundo afora, com projetos idealizados especialmente para este tipo de tecnologia. Com uso de máquinas especializadas e softwares de última geração, profissionais já conseguem construir estruturas completas em 3D, abrindo possibilidades importantes para o setor.
O hubIC, hub de inovação e construção digital, tem o objetivo de desenvolver e criar ambientes cooperativos especializados na promoção de soluções inovadoras na área da construção civil, com ênfase em pesquisas sobre cimento. A iniciativa surgiu de um convênio de cooperação técnica entre a Universidade de São Paulo (USP) e a Associação Brasileira de Cimento Portland (ABCP).
No laboratório, um dos segmentos estudados é a área de impressão 3D, cuja meta é desenvolver soluções para viabilizar técnica e economicamente o uso da tecnologia na indústria da construção. Com a participação de diversas empresas do setor, o projeto atual consiste em imprimir uma cozinha completa em três dimensões, em março deste ano. A previsão é de que o processo dure cerca de 18 horas para ser concluído.
Rafael Pileggi, coordenador de pesquisas do hubIC e professor da Escola Politécnica da USP, diz que a escolha de se construir uma cozinha se deu pelo fato de que o cômodo inclui diferentes subsistemas de uma edificação, como a parte elétrica e hidráulica, por exemplo, colocando à prova diferentes aspectos técnicos. Um dos desafios é conseguir desenvolver o tipo de concreto ideal para cada necessidade de impressão, já que o produto deve ser compatível com a sua rota de produção e com a aplicação: ele deve “suportar o peso das camadas na velocidade esperada e desenvolver as propriedades mecânicas previstas”, segundo Pileggi.
O coordenador conta que cerca de 30 pessoas estão envolvidas no processo. “O projeto de impressão 3D tem diferentes frentes de atuação, envolvendo pesquisadores e alunos da USP, startups, equipe de coordenação do hubIC e apoio das empresas parceiras.”
Leia entrevista com Rafael Pileggi, coordenador do hubIC:
Há, no Brasil, investimento suficiente para o desenvolvimento desta tecnologia? Você acha que o setor da construção deveria focar mais nesta área de impressões 3D?
Rafael Pileggi: Diria que o Brasil tem todo o potencial e estrutura de fomento para o desenvolvimento dessa tecnologia. Contudo, as experiências brasileiras até a inciativa do hubIC têm sido descentralizadas e com recursos específicos. Uma das metas do projeto capitaneado pelo hubIC está em organizar os diferentes agentes da cadeia produtiva em torno de um projeto integrador com diferentes agentes interessados, criando base para decisão de investimentos mais pesados na tecnologia.
Em relação ao setor de construção focar em impressão 3D, posso afirmar que as tecnologias necessárias e que terão sucesso no futuro precisam trazer resultados financeiros positivos conjugando aumento de produtividade em um cenário de mudança da pirâmide etária, desmaterialização, descarbonização, eficiência de projeto, adequação às mudanças climáticas e às novas demandas do ambiente. O fato é que técnicas de manufatura aditiva têm potencial para tudo isso, e por essa razão estão recebendo tanto esforço e atenção em um cenário global.
Quais características o concreto para impressão 3D precisa ter, que o difere do concreto comum?
Rafael Pileggi: É sabido que concretos precisam ter sua “trabalhabilidade” adequada ao uso. Efetivamente, significa dizer que o comportamento reológico de um concreto deve ser compatível com sua rota de produção e aplicação. No caso de impressão 3D, acrescenta-se o fato que suas características também devem ser compatíveis com o projeto do componente desde o estado fresco e com a velocidade de impressão.
Para exemplificar, existem soluções onde o material misturado fluido é bombeado, extrudado e depositado diretamente no local onde se deseja para formação das camadas. Em uma outra tecnologia, o concreto seco é misturado de maneira contínua e recebe a incorporação de novos aditivos diretamente no bocal de extrusão. Sendo assim, cada rota de fabricação leva ao desenvolvimento de materiais distintos, mas que, ao final, precisam ser depositados com precisão no local previsto, suportar o peso das camadas seguintes na velocidade esperada de impressão e desenvolver as propriedades mecânicas previstas.
Em relação à cozinha que será construída, é a primeira vez que vocês colocam em prática a construção de um cômodo inteiro em 3D?
Rafael Pileggi: No caso do hubIC, sim. A cozinha foi idealizada pelo grupo de trabalho em impressão 3D do hubIC, sendo definida por incluir diferentes subsistemas de uma edificação, como elétrica, hidráulica, limpabilidade, estanqueidade, cobertura, entre outros. O grupo de trabalho inclui pesquisadores e representantes de diferentes empresas do setor de construção.
Uma vez que o projeto da cozinha impressa em 3D se torne realidade, quais serão os próximos passos, as próximas metas?
Rafael Pileggi: O primeiro grande resultado da cozinha é a integração dos diferentes agentes do setor da construção em torno de uma solução construtiva inovadora. A cozinha, em si, será alvo de estudos de desempenho e durabilidade, além de todo um estudo de custo de produção. Sendo o projeto da cozinha hubIC pré-competitivo, as empresas envolvidas poderão utilizar o aprendizado, preparando-se para o mercado.
Quando você imagina que a impressão 3D possa ser, de fato, uma realidade comercial para a construção civil? Tanto no Brasil quanto no mundo.
Rafael Pileggi: Essa é a grande pergunta, cuja resposta está cada vez mais próxima. Sabendo que as primeiras operações comerciais no Brasil já estão em andamento, é fato que o uso de 3D no mercado está muito próximo. Importante dizer que a construção é muito mais que impressão 3D e se imagina que essa tecnologia ocupará seu lugar, sem competir com as tecnologias robustas e competitivas atualmente presentes no mercado.
Confira outros projetos em 3D pelo mundo
Vila de casa em 3D nos EUA. Em julho de 2023, foi inaugurada uma vila chamada Wolf Ranch, localizada em Georgetown, no Texas, com 100 casas construídas com impressoras 3D. A comunidade foi idealizada pela Lennar, uma das principais construtoras residenciais dos Estados Unidos, e pela ICON, empresa especializada em construções em 3D. O escritório de arquitetura dinamarquês BIG-Bjarke Ingels Group também fez parte do projeto.
EUA constrói 1ª casa de dois andares em 3D. Houston, também no Texas, foi a cidade escolhida para a construção da primeira casa de dois andares nos Estados Unidos com o uso de impressora 3D. O local conta com três quartos divididos em dois pavimentos, em uma área total de 370 metros quadrados.
Startup dinamarquesa imprime casa em 3D. Ao utilizar a tecnologia de impressão 3D, a empresa 3DCP Group criou, em 2022, uma casa de 37 m² usando concreto real de baixo custo (não argamassa). O projeto teve como prioridade criar uma construção totalmente habitável no menor número de metros quadrados possível.
Ponte de concreto em 3D é atração na Holanda. O chamado Projeto Bridge foi uma iniciativa que teve como meta construir uma ponte de 29 metros em 3D na cidade de Nijmegen, na Holanda. Inaugurada em 2021, a obra contou com colaboração da empresa de engenharia Rijkswaterstaat, do estúdio Michiel van der Kley e da Univerdade de Tecnologia de Eindhoven.
Fontes:
Rafael Pileggi, coordenador de pesquisas do hubIC
Jornalista responsável
Fabiana Seragusa
Vogg Experience
A opinião dos entrevistados não reflete necessariamente a opinião da Cia. de Cimento Itambé.
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