Juros baixos estimulam a hipoteca imobiliária
Para a Abracefi, empréstimo com garantia do imóvel obtém taxas mais baixas dos bancos, e riscos se assemelham aos de outras modalidades.
Para a Abracefi, empréstimo com garantia do imóvel obtém taxas mais baixas dos bancos e riscos se assemelham aos de outras modalidades
Por: Altair Santos
Popularmente conhecido como hipoteca, o empréstimo com garantia do imóvel é uma modalidade que tem oferecido taxas de juros mais atraentes e estimulado a troca de casas e apartamentos por essa via – exceto os vinculados ao programa Minha Casa, Minha Vida. Os micro e pequenos empresários também têm recorrido a ela para incrementar seus negócios. Além disso, há casos de quem tem hipotecado a casa própria para viabilizar o aprimoramento profissional no exterior. Mas qual o risco que medidas como essa trazem? Segundo o presidente da Associação Brasileira dos Corretores de Empréstimo e Financiamento Imobiliário (Abracefi) Marcelo Prata, desde que feito com responsabilidade, esse tipo de captação é vantajoso e, com a tendência de juros baixos, pode se popularizar no Brasil. É o que pode ser conferido na entrevista a seguir:
A modalidade de empréstimo com garantia do imóvel, também conhecida como hipoteca, tem atraído quem busca captar dinheiro com taxas mais baixas de juros. Quais as vantagens deste tipo de negócio?
Oferecer ao tomador a possibilidade de acessar uma linha de crédito com taxas de juros mais baixas do que outras linhas, como o crédito pessoal, capital de giro e, em alguns casos, crédito consignado. O fato do imóvel ser a garantia do crédito mitiga o risco dos bancos que conseguem reduzir seu spread (diferença entre os juros cobrados pelos bancos nos empréstimos a pessoas físicas e jurídicas e as taxas pagas pelos bancos aos investidores que colocam seu dinheiro em aplicações do banco nesse tipo de operação). Além disso, há o fato de se poder aumentar o ticket do empréstimo, isto é, o valor que o cliente vai conseguir levantar com o banco.
Se o empréstimo com garantia do imóvel disseminar, como aconteceu com o empréstimo consignado, não se corre o risco de se entrar num processo de bolha como ocorreu nos EUA?
É preciso entender, inicialmente, o que vem a ser bolha no mercado imobiliário. Em linhas gerais, uma bolha existe quando configura-se um mercado altamente especulativo, ou seja, quando o preço usa como referência apenas a crença dos investidores de que o valor de venda será ainda maior amanhã. Quando o aumento do custo dos imóveis acontece sem que seja acompanhado pelo aumento de demanda ou escassez da oferta, ou ainda, por algum outro motivo plausível, é sinal de que algo está errado. Ainda assim, é fato que, identificar uma bolha, em qualquer que seja a economia, não é uma tarefa simples. Seja como for, o mercado financeiro e bancário brasileiro são muito bem estruturados. Apesar do imóvel ser dado em garantia de uma operação de crédito, a capacidade de pagamento do cliente é um dos principais critérios para que uma aprovação de crédito aconteça ou não. Pode parecer um excesso de zelo e, ao contrário do que muitos pensam, o banco não tem interesse na retomada do imóvel. Fazendo uma analogia com o mundo circense, podemos dizer que um imóvel está para o banco como uma rede de segurança está para o trapezista. Nenhum dos dois pretendem utilizá-los, mas, caso algo dê errado, ela estará lá para proteger. Vale reforçar também que o problema no mercado imobiliário americano não foi única e exclusivamente causado pela bolha imobiliária, mas sim por uma flexibilização exacerbada dos critérios para análise de crédito, onde clientes com amplo histórico de inadimplência conseguiam tomar altas quantias para compra da casa própria: os chamados subprime (créditos de risco).
Por falar em EUA, o modelo adotado aqui no Brasil para empréstimo com garantia do imóvel é semelhante ao que foi praticado lá ou tem diferenças?
Lá, o mercado é basicamente dividido em dois segmentos: as primeiras aquisições e os refinanciamentos. Diferentemente do que acontece no Brasil, nos Estados Unidos a possibilidade de migrar um financiamento de um banco para outro, ou mesmo de um imóvel para outro, é muito mais simples. Embora no Brasil a operação seja exclusivamente utilizada para se levantar capital, tendo um imóvel como garantia, à medida em que o mercado se modernizar deveremos nos aproximar do modelo americano, no sentido de termos melhores ferramentas de funding (recursos que os bancos captam para poder emprestar) além de permitir aos clientes utilizar esse imóvel, ainda financiado, como forma de tomar crédito mais barato. Além disso há o LTV (Loan To Value) termo financeiro que representa em porcentagem o quanto um empréstimo corresponde ao valor da garantia do imóvel. Enquanto no Brasil o LTV médio nas operações de refinanciamento é de 50%, nos EUA podia chegar a 120%. Fica fácil entender porque quando a bolha estourou, grande parte dos imóveis não conseguia cobrir o valor da dívida.
Comparando com outras captações, quanto às taxas de juros, o empréstimo com garantia do imóvel é mais atraente?
Como é uma linha de crédito com uma garantia real (imóvel) o risco do banco diminui significativamente. Nesse caso, utilizar essa linha de crédito pode significar conseguir uma taxa menor e um valor de crédito maior. Não há uma regra geral. O melhor caminho é sempre comparar e pesquisar antes de contratar. Desde 2008 as instituições financeiras são obrigadas a apresentar o CET (Custo Efetivo Total) das operações de empréstimo, que nada mais é do que todos os custos envolvidos, como taxa de juros, seguros e tarifas bancárias. Esse valor é expresso em percentagem e fica fácil saber, efetivamente, qual linha de crédito ou banco é melhor.
Desde quando os bancos passaram a “estimular” o empréstimo com garantia do imóvel?
Desde 2008 o produto já existe no mercado brasileiro. Alguns bancos estão testando o produto ainda de maneira tímida. Acredito que esse mercado deva ultrapassar o de financiamento para habitação na próxima década, pois, uma vez que as pessoas já tiverem seus imóveis para moradia, poderão trocar por novos imóveis, ou então, utilizar essa linha de crédito para viagens, escola dos filhos e outros investimentos com taxas menores.
Em que condições legais o imóvel precisa estar para que possa ser hipotecado?
Embora o termo hipoteca tenha ficado popularmente conhecido, a figura jurídica que rege os contratos nesse tipo de empréstimo é a alienação fiduciária. É similar ao que acontece no mercado de veículos, onde o bem fica em nome do banco até que o cliente termine de quitar o empréstimo. A primeira exigência é que o tomador do crédito seja o proprietário do imóvel. Os bancos há muito tempo realizam esse tipo de operação, aceitando imóveis urbanos e rurais, no entanto, esse produto só estava disponível para clientes com grande movimentação bancária. Os atuais produtos, que chamamos de “prateleira”, ou seja, que estão disponíveis para a pessoa física em todo o Brasil, exigem que o imóvel esteja regularizado, isto é, tenha escritura pública registrada em cartório. A maioria dos bancos também exige que a construção sobre o terreno esteja averbada em cartório, com todo o recolhimento de impostos em dia. No entanto, já existem bancos que aceitam o terreno como garantia do empréstimo, independentemente da construção.
Em média, qual o limite dos empréstimos feitos através da hipoteca de imóveis?
Do ponto de vista do valor do imóvel, a média nacional é de 50% do valor, podendo, em alguns casos, chegar até 70%. Ainda assim, será analisada a capacidade de pagamento do tomador. Os bancos querem estar certos de que ele terá condições de pagar as parcelas mensalmente, afinal de contas, é daí que vem a remuneração dos bancos.
Os microempresários têm sido os que mais procuram essa modalidade de empréstimo?
O perfil do tomador do crédito varia de banco para banco. Micros e pequenos empresários dividem a preferência pelo produto com pessoas físicas que necessitam consolidar suas dívidas. É comum o caso de pessoas que tomaram várias linhas de crédito, com taxas mais altas e em prazos variados, desejarem trocar essas dívidas por uma única, com uma taxa menor e com maior prazo para pagar.
Feita a hipoteca do imóvel, a partir de que momento ele pode perder o imóvel?
No caso de deixar de pagar o empréstimo, assim como acontece em qualquer contrato de um bem de alto valor, seja um carro, moto ou uma máquina, o prazo que cada banco tolera de inadimplência também varia. Mas nossa experiência mostra que o prazo máximo de inadimplência que um banco tolera, antes de iniciar o processo de retomada do imóvel, é de 90 dias. Portanto, quem adquire essa linha de crédito tem que ser rápido em procurar o banco caso perceba que terá problemas para pagar a parcela do mês seguinte. Vale lembrar que, no caso da retomada do imóvel, este irá a leilão. Caso o valor de arremate seja superior ao valor da dívida, incluindo as despesas com o processo, a diferença é devolvida ao cliente. Ou seja, ele só perde aquilo que deixou de pagar, somado às despesas do processo. Afinal, é preciso lembrar que ele recebeu o valor do banco e já o deve ter utilizado para outra finalidade.
Qual a avaliação que a Abracefi faz deste tipo de empréstimo?
Acreditamos que o futuro dos juros baixos no Brasil passa pela expansão dessa linha de crédito. Por outro lado, defendemos que esse mercado cresça de maneira sustentável. Foi exatamente o que nos levou a criar a Abracefi como forma de treinar os profissionais que venham a atuar nesse segmento e a penalizar aqueles que atuem de forma inidônea. Ter acesso a crédito exige que o brasileiro aprenda a lidar de maneira responsável com ele e isso passa por educação financeira e transparência dos bancos. Infelizmente, existe uma cultura ainda enraizada em muitas pessoas de que se não der para pagar a dívida ela “caduca” em 5 anos e isso faz pensar que tomar um crédito sem garantia seja melhor. No entanto, que sentido faz pagar 5%, 10%, 15% ao mês de juros quando se pode conseguir um crédito a 1,5% ao mês. Não faz mais sentido aprender a se planejar financeiramente para pagar menos juros do que ficar inadimplente e perder o nome na praça? Com responsabilidade dos bancos, do tomador do crédito e dos profissionais que atuam nesse segmento, não vemos riscos para a economia ou para o mercado. Pelo contrário, ele é o sinal de que estamos entrando em uma fase de maturidade do Brasil em relação ao crédito.
Entrevistado
Marcelo Prata, presidente da Associação Brasileira dos Corretores de Empréstimo e Financiamento Imobiliário (Abracefi)
Currículo
– Presidente da Abracefi (Associação Brasileira dos Corretores de Empréstimo e Financiamento Imobiliário) e fundador do Canal do Crédito (primeiro site de comparação de produtos financeiros do Brasil)
– Membro do Conselho Consultivo do Clube da Reforma
– Atua há dez anos no mercado de crédito imobiliário com experiência nas áreas de formalização de operações e atendimento ao consumidor
– Possui formação como técnico em transações imobiliárias e é graduado em gestão em processos gerenciais pela FGV (Fundação Getúlio Vargas)
Contato: marcelo.prata@abracefi.org.br / secretaria@abracefi.org.br
Créditos foto: Divulgação
Jornalista responsável: Altair Santos – MTB 2330
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