Grafeno ganha 1ª norma técnica nacional
Nano material deve revolucionar o uso de materiais já consagrados na engenharia
O grafeno acaba de ganhar a sua primeira norma técnica nacional, a ABNT ISO/TS 21356-1. O documento foi publicado pela Associação Brasileira de Normas Técnicas (ABNT) e contou com apoio do Instituto Nacional de Metrologia, Qualidade e Tecnologia (Inmetro).
O Grafeno é um nano material de carbono com um conjunto de propriedades físicas e químicas inusitadas, cujas multifuncionalidades têm atraído a indústria para sua utilização e na criação de uma nova classe de materiais.
“Ele tem o potencial de revolucionar o uso não só com novos materiais, mas com uma nova visão de engenharia para materiais já consagrados como polímeros, elastômeros, materiais cimentícios e outros diretamente ligados a mercados que são relevantes na economia brasileira e com entrada quase que imediata no mercado nacional”, aponta Valdirene Sullas Teixeira Peressinotto, Head de P&D da Gerdau Graphene e membro da Comissão de Estudo Especial de Nanotecnologia (ABNT/CEE-089).
Valdirene também ressalta que o grafeno é peça fundamental na revolução tecnológica em mercados como o de energia, possibilitando novas tecnologias mais sustentáveis para baterias, por exemplo.
Norma ABNT ISO/TS 21356-1
Quando se desenvolve um novo material como o grafeno, surgem várias questões sobre quais propriedades deste material são interessantes, e sobre como estas propriedades podem ser determinadas.
A norma ABNT ISO/TS 21356-1, que de fato é uma especificação técnica, trata da caracterização estrutural do grafeno na forma particulada e dispersões, segundo o professor Luiz Gustavo Cançado, do Departamento de Física da UFMG e coordenador da Comissão de Estudo Especial de Nanotecnologia (ABNT/CEE-089).
“Ela apresenta definições e protocolos para determinação do número de camadas, dimensões laterais dos flocos, alinhamento entre camadas, nível de desordem e área específica do pó contendo grafeno. A ISO/TS 21356-1 foi traduzida para o português pelo grupo de trabalho GT4-Materiais Bidimensionais, da Comissão de Estudo Especial de Nanotecnologia (ABNT/CEE-089)”, pontua Cançado.
De acordo com o professor, algumas definições podem parecer triviais, mas principalmente em se tratando de nanomateriais, o consenso só é possível após amplo debate. “Esta norma serve para estabelecer padrões e dar algum tipo de direcionamento nos procedimentos de caracterização estrutural do grafeno”, expõe Cançado.
Uma das questões debatidas foi o limite de número de camadas de um floco para que ele seja considerado grafeno. “O grafeno não é necessariamente formado por uma única camada. Ele pode ser formado pelo empilhamento de várias camadas, tal como o grafite. Após muito debate, os especialistas que criaram esta norma decidiram que um floco deve possuir entre 3 e 10 camadas para ser denominado como grafeno de poucas camadas. Abaixo disso temos o grafeno de uma única camada ou a bicamada de grafeno. Acima temos as nanoplacas de grafeno, que possuem espessura entre 1 e 3 mm, ou o próprio grafite que é um cristal formado por camadas de grafeno empilhadas”, destaca o professor.
Além de estabelecer as definições das propriedades de interesse e dos termos relacionados, a norma define as melhores técnicas e procedimentos para se medir tais propriedades. “Novamente, tais definições são baseadas em amplo debate entre especialistas. Voltando ao exemplo de número de camadas, trata-se de uma característica estrutural que pode ser medida de diversas formas, principalmente microscopias (de varredura por sonda ou eletrônica de transmissão) ou espectroscopias ópticas (espalhamento Raman e absorção no UV-visível). Como se tratam de técnicas indiretas, algo bem comum em nanomateriais, os resultados obtidos entre as técnicas nem sempre concordam entre si. É preciso então que se compreenda os resultados de cada técnica, e que se estabeleça o tipo de informação que aquele resultado pode entregar. Tomando novamente o exemplo de número de camadas, uma técnica pode indicar que um certo material possui um percentual grande de grafeno, e outra pode indicar o oposto. Isso pode ser causado, por exemplo, pela formação de agregados facilmente detectáveis por microscopia de varredura, mas indetectáveis pela espectroscopia Raman. A norma ABNT ISO/TS 21356-1 busca informar e instruir as pessoas para o entendimento correto sobre este tipo de informação desencontrada. Ela ainda possui limitações que deverão ser discutidas nas etapas de revisão, algo natural quando se trata de um material relativamente novo”, explana Cançado.
Uso do grafeno no Brasil
O Brasil possui abundância de matéria-prima para produção de grafeno, seja para métodos de produção a partir de grafite ou para métodos de produção a partir de outras fontes de carbono, segundo Valdirene. Além disso, possui mercado para absorver a entrada do material e possui conhecimento científico para qualificação técnica. “O grafeno é produzido a partir de fontes de carbono, como por meio da grafita, ou por fonte orgânica como metano ou celulose. Os processos industriais de produção de grafeno em larga escala concentram-se em produção a partir da grafita e o Brasil está entre os três primeiros colocados e reserva do minério grafita, bem como entre os três maiores produtores de grafite”.
Atualmente existem alguns produtos comerciais com grafeno, principalmente em produtos poliméricos, alguns revestimentos, pneu e alguns produtos na área de energia. “Porém, com entrada no mercado ainda de forma modesta frente ao potencial de mercado para estas e outras áreas”, explica Valdirene
Um exemplo disso é a diminuição de petroquímicos em plásticos mais resistentes que possibilitam a diminuição de espessura na aplicação final, ou redução das emissões de CO₂ devido a redução do uso de clínquer em concretos aditivados com grafeno.
“Estamos desenvolvendo aditivos a base de grafeno e lançando os primeiros produtos no mercado nacional voltados para os mercados de polímeros, tintas e revestimentos, concretos e materiais cimentícios, elastômeros e óleos lubrificantes”, destaca Valdirene.
Para a adoção do grafeno no mercado, um dos gargalos está representado na necessidade das empresas de conseguirem qualificar os diferentes produtos que compõe a classe de materiais que recebem o nome de grafeno. “Começa com a nomenclatura e com as metodologias de caracterização do nano material, de forma que a indústria possa desenvolver seus métodos de controle e de reprodutibilidade. A norma é o primeiro passo para a adoção do material na indústria e para que comece a ocorrer a migração de concentração do conhecimento da academia para a indústria e, consequentemente, o desenvolvimento de aplicações industriais e aumento de produtos com grafeno no mercado”, conclui Valdirene.
Entrevistados:
Valdirene Sullas Teixeira Peressinotto é Head de P&D da Gerdau Graphene e membro da Comissão de Estudo Especial de Nanotecnologia (ABNT/CEE-089).
Luiz Gustavo Cançado é professor do Departamento de Física da UFMG e coordenador da Comissão de Estudo Especial de Nanotecnologia (ABNT/CEE-089).
Contato
Assessoria de imprensa ABNT – daniela.nogueira@fsb.com.br
Jornalista responsável
Marina Pastore
DRT 48378/SP
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