Faltam áreas para o MCMV cumprir função social
Terrenos encareceram e programa hoje atende mais ao sistema de habitação de mercado que o sistema de habitação de interesse social, apontam pesquisadores.
Terrenos encareceram e Programa hoje atende mais ao sistema de habitação de mercado que o sistema de habitação de interesse social, apontam pesquisadores
Por: Altair Santos
Há um ano, a presidente Dilma Rousseff lançou a etapa dois do Programa Minha Casa, Minha Vida (MCMV). A nova fase prioriza as habitações de interesse social, com o ousado objetivo de construir dois milhões de residências até 2014. Só que, para atingir essa meta, o plano terá de superar um dos gargalos que ameaçam comprometer seu avanço: a escassez de terrenos.
Nas principais capitais brasileiras, o Programa Minha Casa, Minha Vida tem sido empurrado cada vez mais para bairros distantes e regiões metropolitanas. O motivo está relacionado à indisponibilidade de áreas para construir. Além de o estoque de terras públicas estar se esgotando, a especulação imobiliária encareceu demasiadamente os terrenos.
Umas das soluções encontradas pelas construtoras para superar esse gargalo é a compactação das moradias. Há 10 anos, a área útil das habitações tinha, em média, de 70m² a 90m². Atualmente, os lançamentos variam de 40m² a 60m². Em contrapartida, por causa da escassez de terrenos, o custo por unidade disparou. Hoje, independentemente da região do país, não se compra um imóvel por menos de R$ 170 mil.
Para a geógrafa urbana Leda Velloso Buonfiglio e o sociólogo Rodrigo Dantas Bastos, que na Unicamp (Universidade Estadual de Campinas) defenderam a tese “O Programa Minha Casa, Minha Vida e o preço da terra urbana no Brasil”, pode ter havido um equívoco governamental na concepção do Programa Minha Casa, Minha Vida. Segundo os pesquisadores, o plano não deveria contemplar, ao mesmo tempo, o sistema de habitação de mercado e o sistema de habitação de interesse social.
Buonfiglio avalia que o acesso aos subsídios públicos oriundos do FGTS e de fundos públicos fez o setor privado assumir o controle do MCMV 2, prometendo atender o mercado específico de baixa renda, mas na prática isso não se viabiliza. “Para ficarmos com um só exemplo, no Rio Grande do Sul os investimentos em unidades contratadas do MCMV representaram 38% para a baixa renda, enquanto as unidades para as classes de média renda representaram 61%”, cita.
Rodrigo Dantas Bastos entende que foi um “erro” do estado ter incluído a política de habitação de interesse social no Minha Casa, Minha Vida. “O Programa não foi feito para isso. Ele foi criado para reaquecer a indústria da construção civil. O MCMV é uma linha de crédito para o consumo de imóveis e, neste aspecto, cumpriu seu papel. Agora, foi um erro entregar ao mercado uma tarefa que o mercado não pode resolver, que é o combate ao déficit habitacional”, analisa.
Dados do Secovi-SP (Sindicato da Habitação de São Paulo) revelam que no país, atualmente, 60% da carência de moradias está concentrado nas classes D e E. Para Leda Velloso Buonfiglio, esse gargalo só será resolvido com intervenção direta do poder público e a criação de uma política habitacional dentro dos municípios. “Há ferramentas legais para isso, através do Estatuto das Cidades, que permitem o acesso à terra para o poder público viabilizar empreendimentos populares”, diz.
Diante deste quadro, os pesquisadores concluem que o Minha Casa, Minha Vida cumpre um papel importante na economia do país, por ter três aspectos: ter reativado o financiamento habitacional, ter estimulado o aquecimento da construção civil e ter contribuído para gerar milhares de empregos formais. No entanto, segue pecando ao não priorizar o atendimento da população com rendimento de zero a três salários mínimos. “Como política habitacional, ele não resolveu o problema, assim como o BNH não resolveu”, finaliza Rodrigo Dantas Bastos.
Confira o trabalho
O programa Minha Casa, Minha Vida e o preço da terra urbana no Brasil: Clique aqui
Entrevistados
Leda Velloso Buonfiglio e Rodrigo Dantas Bastos, pesquisadores e autores da tese “O programa Minha Casa, Minha Vida e o preço da terra urbana no Brasil”
Currículo
– Leda Velloso Buonfiglio é doutoranda e mestre em Geografia, pela Unicamp (Universidade -Estadual de Campinas), com especialidade em geografia urbana.
– Tem ênfase na análise sobre o direito à cidade, o direito à moradia e a dinâmica dos movimentos sociais urbanos contemporâneos, enfocando nas políticas públicas de habitação popular.
– Rodrigo Dantas Bastos é graduado em Ciências Sociais pela Universidade de São Paulo e advogado pela Pontifícia Universidade Católica de São Paulo, com mestrado em sociologia pela Universidade Estadual de Campinas.
Contatos: ledabuonfiglio@yahoo.com.br / rodrigodantasbastos@gmail.com
Créditos foto: Divulgação
Jornalista responsável: Altair Santos – MTB 2330
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