Escassez de mão de obra preocupa construção civil; industrialização busca nova geração
Setor tem o desafio de buscar formas para amenizar o problema e qualificar profissionais
A falta de trabalhadores na construção civil é um problema que não vem de hoje. Durante uma palestra realizada em janeiro deste ano, o vice-presidente de Tecnologia e Qualidade do SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo), Jorge Batlouni Neto, fez questão de relembrar um estudo da Abramat (Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção) e da Escola Politécnica da Universidade de São Paulo, de 2007, que já alertava para este problema.
O conteúdo falava sobre a falta de motivação para se trabalhar na construção civil, devido aos salários pouco atrativos, à precariedade na contratação, às condições adversas de trabalho e ao grande desgaste físico. “Em 2007, já estava claríssimo o diagnóstico de como é o trabalhador na construção civil”, diz Batlouni Neto, referindo-se aos desafios que precisam ser enfrentados.
Durante a apresentação, o vice-presidente de Tecnologia e Qualidade do SindusCon-SP também destacou que a idade média do trabalhador da construção está crescendo muito, ou seja, que “eles estão ficando mais velhos dentro do canteiro”. Uma pesquisa do PNAD (Pesquisa Nacional por Amostra de Domicílios), de 2004, mostrava que a idade média desse trabalhador era de 36,1 anos, e outro levantamento mais recente, de 2013, já indicou que a idade passou para 38,3 anos. “E tem uma tendência a aumentar cada vez mais”, afirmou Batlouni Neto. Para simbolizar esse retrato atual, ele cita frases como “o filho do mestre de obras quer ser engenheiro” e “o filho do pedreiro não quer ser pedreiro”.
Importância da industrialização
Íria Doniak, presidente executiva da Abcic (Associação Brasileira da Construção Industrializada de Concreto), diz que a escassez de mão de obra na construção civil é geral, “porém, a indústria, por ter uma estrutura organizada para a continuidade dos processos, possibilita um maior interesse do funcionário por permanência, devido às oportunidades de avanços e desenvolvimento de carreira e um ambiente propício à inovação, que enseja novos aprendizados e conhecimentos técnicos”.
Ela também ressalta que todos os cuidados voltados à integridade, segurança, e saúde ocupacional possibilitam melhor qualidade de vida e auxiliam na redução do turnover (taxa de rotatividade de colaboradores) – em dezembro de 2023, o SindusCon-SP e a Falconi lançaram uma pesquisa inédita chamada Práticas de Gestão de Pessoas na Construção Civil, que realizou um levantamento de informações sobre o perfil dos trabalhadores do setor, com dados sobre turnover, remuneração e benefícios.
“A indústria brasileira de pré-fabricados, em relação às indústrias dos países desenvolvidos, como alguns países europeus e Estados Unidos, tem um menor grau de automação. A tendência, à medida em que a mão de obra se torne mais escassa, é passar para um grau de automação mais elevado e lançar mão de mais tecnologia com novas ferramentas, incluindo a robotização“, afirma Íria Doniak. “Em termos de construção civil em geral, é importante se levar em conta que não estamos somente falando de mão de obra operacional, mas também intelectual. Em outras áreas, como projetos, por exemplo, há uma evasão de jovens talentos do país e falta de estímulo por salários baixos e ciclos de descontinuidade.”
Maior interesse da nova geração
A presidente executiva da Abcic explica que a industrialização traz diversos benefícios à construção civil, como maior produtividade e previsibilidade, atendimento de cronogramas ousados, redução de custos e desperdícios bem como a diminuição das emissões de carbono. “A questão da mão da obra também é importante no que se refere à industrialização, pois há uma maior qualificação dos profissionais que vão atuar na etapa construtiva, o que contribui para a retenção de talentos no setor e um maior interesse por parte da nova geração, devido ao uso de tecnologia e inovação.”
Outro ponto a ser considerado, de acordo com a especialista, é que as estruturas pré-fabricadas de concreto são produzidas e fornecidas pela indústria, e o canteiro de obras se transforma em um canteiro de montagem, com um número menor de profissionais dentro desse ambiente, colaborando para aumentar a segurança e diminuir os riscos de acidente. “Existem muitos esforços sendo realizados para uma maior industrialização da construção civil brasileira, tanto é que o uso das estruturas pré-fabricadas de concreto tem se ampliado em segmentos distintos e em diversas tipologias.”
Ela explica que, contudo, no mercado imobiliário, que detém a maior parte das obras do país, há ainda muito espaço a crescer. “Pois o que temos visto é um movimento de racionalização da obra, que é uma etapa anterior à industrialização. É importante ressaltar que os diversos tipos de sistemas construtivos industrializados podem ser utilizados em conjunto, ou seja, mesclando parte deles, de forma completa e até híbrido com a construção convencional, o que resulta em versatilidade“, diz Íria Doniak.
“O Programa Construa Brasil precisa ser mais impulsionado. O atual governo, através do MDIC [Ministério do Desenvolvimento, Indústria, Comércio e Serviços], adotou o programa que se iniciou no governo anterior em três eixos, desburocratização, digitalização e industrialização. Mas precisa de mais tração para avançar em temas fundamentais que se constituem em barreiras importantes para que a industrialização da construção avance, como a questão tributária e sistemas de financiamento, além de avançar incluindo novas disciplinas nas escolas de engenheira e arquitetura das universidades.”
Fontes
Íria Doniak, presidente executiva da Abcic
SindusCon-SP (Sindicato da Indústria da Construção Civil do Estado de São Paulo)
Jornalista responsável
Fabiana Seragusa
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