Engenharia Natural é profissão do presente e do futuro
Também conhecida como Bioengenharia de Solo, profissão desembarca nas obras de infraestrutura e mexe no mercado de trabalho
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Neste mês, a cidade de Copenhague, na Dinamarca, sedia a conferência sobre mudanças climáticas. As nações vão definir metas para conter o avanço do efeito estufa e criar estímulos para projetos que reduzam a interferência no meio ambiente. Dentro deste cenário, começa a se destacar um novo tipo de engenharia: a Engenharia Natural.
No Brasil, empresas envolvidas com obras de infraestrutura começam a se interessar por profissionais especialistas em Engenharia Natural. Os cursos no país são poucos e estão no nível da pós-graduação. Assim, quem se especializa é imediatamente requisitado.
Fabrício Jaques Sutili, professor-adjunto do Departamento de Engenharia Florestal do Centro de Educação Superior Norte-RS da Universidade Federal de Santa Maria, é uma das referências do país no assunto. Nesta entrevista, ele revela como a Engenharia Natural pode ser útil às obras que o Brasil planeja construir. Confira:
Qual a diferença entre Bioengenharia de Solos e Engenharia Natural?
Nenhuma. Existe uma profusão de sinônimos: Engenharia Naturalística, Engenharia Biofísica, Engenharia Verde… Os termos Bioengenharia de Solos e Engenharia Natural foram os que se consolidaram. No Brasil usam-se ambos. Em Portugal, consolidou-se o segundo, existindo inclusive a Associação Portuguesa de Engenharia Natural (APENA).
Qual, então, a definição de Engenharia Natural?
Trata-se de uma área da engenharia que valoriza soluções que lancem mão das características técnicas da vegetação, associadas ou não a métodos e materiais tradicionais, para solucionar problemas que vão desde a erosão superficial do solo até a estabilização de encostas ou taludes artificiais. O mais importante é que a vegetação seja entendida como componente estrutural e não somente como acabamento estético.
No Brasil, a Engenharia Natural já encontra demanda ou ainda carece de um melhor entendimento do mercado?
Devo concordar que no Brasil ainda carecemos não só de uma maior compreensão sobre as potencialidades de aplicação, como também existe a necessidade de se buscar informações que subsidiem a aplicação das técnicas. Refiro-me especialmente a necessidade de pesquisas que apoiem com informações sobre as características biotécnicas da vegetação. Os modelos de intervenção podem ser, em parte, copiados de outros lugares, já as propriedades técnicas da nossa vegetação devem ser ainda investigadas.
Obras em ambiente fluvial e rodovias são as que melhor podem se aproveitar da Engenharia Natural?
A Engenharia Natural encontra sua maior aplicação na estabilização de taludes fluviais e de encostas, bem como na estabilização de taludes artificiais (sejam de corte ou aterro), como os provenientes da construção de estradas. Particularmente me dedico à aplicação das técnicas de Engenharia Natural em ambiente fluvial, no entanto, vejo sua utilização no ambiente rodoviário como bastante promissora do ponto de vista comercial.
No que a Engenharia Civil pode agregar a Engenharia Natural?
A Bioengenharia de Solos ou Engenharia Natural vale-se enormemente dos conceitos da Engenharia Civil. Estas obras, apesar de sua simplicidade, são obras de engenharia e devem respeitar os rigores de planejamento e intervenção próprios de qualquer intervenção deste tipo. O que difere as biotécnicas das técnicas tradicionais é o fato de utilizarem como componente estrutural, também, elementos vivos (plantas). Uma das grandes dificuldades hoje não só no Brasil é encontrar parâmetros para o cálculo de estabilidade destas obras. Está aí um grande desafio de engenharia.
Obras em concreto e obras com o conceito de Engenharia Natural podem coexistir no mesmo projeto?
Não só podem coexistir no mesmo projeto, como o concreto pode fazer parte das intervenções de Engenharia Natural. O conceito de Engenharia Natural dado por SCHIECHTL (uma das maiores autoridades na área) diz: São técnicas (biotécnicas) em que plantas, ou partes destas, são utilizadas como material vivo de construção. Sozinhas, ou combinadas com materiais inertes, tais plantas devem proporcionar estabilidade às áreas em tratamento. O concreto é um material inerte (assim como madeira, pedra, metal…) que pode ser combinado com materiais vivos. E aí está outro desafio de engenharia, para esse setor econômico.
Já há cursos no Brasil, ou apenas a Universidade Federal de Santa Maria está investindo nesta área?
Não existe nem no Brasil ou em outro país um curso superior que trate somente da Engenharia Natural. O que existe são cursos superiores que valorizam (com maior ou menor ênfase) em seu currículo esse campo de conhecimento. Em algumas universidades da Europa existem institutos de pesquisa exclusivos ao tema. No Brasil já existem universidades se interessando por essa área. Na Universidade Federal de Santa Maria (UFSM) a Bioengenharia de Solos é uma linha de pesquisa do Programa de Pós-Graduação em Engenharia Florestal, bem como o conteúdo é tratado dentro da disciplina de Manejo de Bacias Hidrográficas que é obrigatória do curso de graduação em Engenharia Florestal e é oferecida como disciplina optativa para outros cursos da universidade. A Faculdade de Agronomia da Universidade Federal do Rio Grande do Sul vem se interessando pelo tema e, juntamente com o Instituto de Pesquisas Hidráulicas da mesma instituição, vem promovendo palestras e cursos para seus alunos de graduação e pós. O Instituto Nacional de Pesquisas da Amazônia através dos seus programas de pós-graduação vem se envolvendo com o tema. Tenho conhecimento de monografias sobre o tema escritas em cursos de geografia, arquitetura, engenharia civil e engenharia florestal de diferentes universidades. Essas últimas, normalmente, são iniciativas que partem do interesse particular do acadêmico, não quer dizer que o tema seja diretamente tratado durante o curso de graduação.
Como está o processo de utilização da Engenharia Natural em outros países? Em qual deles ela está mais avançada?
Estas técnicas consolidaram-se e encontram-se mais difundidas na Europa central, em países como Áustria, Alemanha, França, Suíça e no norte da Itália; bem como na America do Norte. Ultimamente vem ganhando bastante aplicação no ambiente mediterrânico. Com apoio de instituições (universidades) europeias começam a existir alguns exemplos na América do Sul. Duas universidades se destacam como difusoras na America Latina: a Universität für Bodenkultur, de Viena, na Áustria, com seu convênio com o Departamento de Engenharia Florestal do Centro de Educação Superior Norte da Universidade Federal de Santa Maria, e a Università degli Studi di Firenze, pelos trabalhos realizados especialmente na Nicarágua e também pelo contato que possui com a UFSM.
O brasileiro que quiser se especializar em Engenharia Natural tem de sair do país para estudar?
Não necessariamente. Claro que estudar em um instituto que se dedique integralmente ao tema, e já tenha tradição, é um diferencial. No entanto, já existem cursos de graduação que possuem o tema eu seus currículos e cursos de pós-graduação que já desenvolvem dissertações e teses na área.
Há muitos profissionais especializados hoje no Brasil?
Acredito que não. Mesmo na UFSM o tema foi incluído há pouco tempo no currículo e a linha de pesquisa na pós-graduação é uma das mais recentes de todas.
Os profissionais existentes no Brasil hoje, que entendem de Engenharia Natural, estão trabalhando em que tipo de empresa ou a maioria está atuando em pesquisa e educação?
A maioria ainda está atuando na pesquisa e educação (como é a lógica normal). Profissionais em empresas ou autônomos que ofereçam projetos de Engenharia Natural ainda são poucos. Com o tempo teremos profissionais saindo dos cursos de engenharia (das diferentes modalidades) com esse conhecimento.
Esses profissionais são bastante requisitados para projetos?
Sim. Os professores e pesquisadores dedicados ao tema não tem falta de trabalho e são constantemente requisitados a opinar e colaborar em diferentes níveis, desde a realização de cursos técnicos extra-universitários até a participação em projetos. A situação se agrava por ainda serem poucos os técnicos formados já com condições de atuarem nesse ramo de mercado.
Existe no país atualmente um projeto que seja um case de Engenharia Natural?
Sim. Na região Sul temos várias obras implantadas pela UFSM e por empresas; além de um programa de investigação das características biotécnicas da vegetação que se desenvolve desde o ano de 2001. Apesar de serem poucas, na região central do país, existem empresas capacitadas e, por que não dizer, já com tradição em Engenharia Natural.
Entrevistado:
Fabrício Jaques Sutili, professor-adjunto do Departamento de Engenharia Florestal do Centro de Educação Superior Norte-RS da Universidade Federal de Santa Maria: fjsutili@gmail.com
Vogg Branded Content Jornalista responsável Altair Santos MTB 2330
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