Como tornar as estruturas mais resilientes para desastres naturais?
Eventos climáticos extremos pedem que construções sejam mais resistentes
Um relatório do U.S. Green Building Council (USGBC) destaca que, entre 2000 e 2019, o número de desastres naturais aumentou em 75% em comparação com o período de 1980 a 1999. Nos primeiros seis meses de 2024, enchentes resultaram em mortes e deixaram milhares de desabrigados no Rio Grande do Sul e em regiões distantes como Indonésia, Afeganistão e Quênia. Estes eventos climáticos têm um impacto humano e econômico significativo. Somente no Brasil, entre 2013 e 2023, esses eventos custaram quase R$ 640 bilhões, afetando milhões de famílias e causando a perda de vidas.
Para diminuir ou mitigar os efeitos destes eventos climáticos e evitar que mais desastres como estes aconteçam, as construções e os métodos construtivos devem passar por mudanças e se tornar mais resilientes.
“A atualização das normativas e legislações brasileiras tem conduzido para infraestruturas mais duráveis e com maior planejamento, sendo atualmente exigidas todas as licenças ambientais, planos de manejo, de destino dos resíduos, e de manutenção. Porém, existe uma porção grande de obras implementada sob a ótica de normativas antigas, e que precisa de atualização”, pontua Lucas Vaslanv da Silva Wolff, professor dos cursos de Engenharia Civil e Arquitetura da FAE Centro Universitário.
Dentre os desafios para a adequação destas construções já existentes está o rastreio das informações pertinentes a estas obras, pois boa parte das documentações de projeto e construção é perdida com os anos, o que requer um trabalho inicial de levantamento de dados da estrutura para poder entender suas necessidades para as eventuais obras necessárias para atualização. “Vencida esta etapa inicial, que consiste em vários levantamentos de campo e ensaios de laboratório, vem a implementação das novas normativas e construção de todas as documentações de segurança atualmente necessárias para uma estrutura existente de resiliência”, explica Wolff.
Wolff também lembra que, dentre as soluções técnicas aplicadas, destacam-se concretos com aditivos e adições que conferem maior resistência, menor porosidade e menor necessidade de manutenção. “Está sendo implementado também o uso de fibras poliméricas, que melhoram as propriedades do concreto e a fissuração, com a proteção do aço em seu interior”, informa o professor da FAE.
Planejamento e gestão de riscos para estruturas mais resilientes
De acordo com Wolff, o planejamento e gestão de riscos ainda é incipiente em obras de infraestrutura de transporte. “Uma das dificuldades do uso de novas tecnologias neste ponto é a ausência de normativas que conduzam o uso para serem implementadas de forma consciente. Para as tecnologias já normatizadas, existe o dever fundamental na fiscalização do cumprimento desta. Uma vez as normativas e legislações cumpridas para a construção e manutenção das infraestruturas, ainda se faz necessário implementar um plano de inspeções rotineiras para fiscalizar o comportamento. As inspeções geram relatórios de anomalias que, ao serem classificadas por uma tabela GUT (Gravidade, Urgência e Tendência de evolução), por exemplo, orientam os prazos a serem cumpridos para as ações de mitigação e correção”, afirma o professor.
Além das inspeções rotineiras, Wolff destaca também sobre a atualização de documentação de segurança, necessitando maior frequência quanto maior o Dano Potencial Associado (DPA) e maior a Categoria de Risco (CR) que a estrutura possa apresentar.
“A atualização da documentação de segurança consiste na revisão de estudos de estabilidade e condicionantes ambientais que influenciam na durabilidade de uma estrutura, incluindo eventualmente estudos de campo, topográficos, geotécnicos, e demais ensaios para conhecimento do estado da arte das estruturas”, comenta o professor.
Contenção de chuvas
Um dos problemas mais graves e frequentes no Brasil são as fortes chuvas, que acabam gerando desastres como o do Rio Grande do Sul. Neste caso, Wolff destaca algumas das formas de mitigar danos destes eventos climáticos extremos, como:
* A implementação de bacias de contenção e reservatórios regulatórios de vazão, por meio de barragens ou diques;
* O controle de encostas, com a criação da documentação de segurança;
* Os planos de monitoramento das encostas em rodovias, tanto por inspeção quanto por instrumentação.
De acordo com Adriane Savi, coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo Integral da FAE Centro Universitário, uma solução relevante para a redução e até mesmo mitigação dos efeitos climáticos diz respeito às cidades biofílicas, que trazem a integração de soluções baseadas na natureza. “Elas propõem a criação de corredores verdes e azuis para ajudar nas questões climáticas. Os corredores verdes são estas conexões através desses grandes hubs de vegetação. Isto inclui criar ruas arborizadas e parques lineares para fazer a conexão em diferentes pontos na cidade. Estas iniciativas contribuem na mitigação de ilhas de calor e a vegetação também ajuda na absorção de água. Além dos corredores verdes que criam essas conexões entre grandes maciços de vegetação nas cidades, outra opção são os corredores azuis. Isso vai envolver a descanalização de rios, tratamento de rios e devolução de rios para o uso da própria cidade (para esportes aquáticos, por exemplo). Isso vai contribuir para que tenhamos essa contribuição para o desenvolvimento das cidades. Esses são dois caminhos que dá para pensar quando falamos em mitigação das questões climáticas dentro dos centros urbanos, para reduzir o impacto de catástrofes como a do Rio Grande do Sul e na Bahia”, destaca Adriane.
Infraestrutura mais resiliente nas rodovias
No dia 1º de julho de 2024, o Ministério dos Transportes publicou no Diário Oficial da União a Portaria 622, que define diretrizes essenciais para a destinação de recursos em contratos de concessão rodoviária. As novas normas têm como foco o desenvolvimento de infraestrutura resiliente, a redução das emissões de gases de efeito estufa (GEE) e a promoção da transição energética.
De acordo com Wolff, hoje já é implementada a avaliação econômica na escolha da tecnologia de infraestrutura a ser construída ou reparada, com base na IS-214 (DNIT, 2006), em que são consideradas as variáveis referentes aos custos de manutenção das estruturas, ou seja, uma tecnologia de implementação mais cara pode acabar sendo utilizada pois sua manutenção ao longo da vida útil é menos frequente e mais barata.
“Por exemplo, está se disseminando o uso de pavimento de concreto em vez do pavimento asfáltico. Ainda, o pavimento de concreto apresenta menor manutenção e absorção de luz solar, o que reduz os gastos também com iluminação pública ao considerar a refletividade do concreto em relação ao asfalto. Essas ações já eram uma realidade antes da Portaria 622, mas tendem a se intensificar à medida que os gastos relacionados ao aproveitamento de energia e à redução de emissões de GEE passam a ser incluídos na avaliação econômica das escolhas tecnológicas.”, destaca Wolff.
Entrevistados
Lucas Vaslanv da Silva Wolff é professor dos cursos de Engenharia Civil e Arquitetura da FAE Centro Universitário, com mestrado na área de estruturas e geotecnia.
Adriane Savi, coordenadora do curso de Arquitetura e Urbanismo e Arquitetura e Urbanismo Integral da FAE Centro Universitário.
Contatos
lucas.wolff@fae.edu
adriane.savi@fae.edu
Jornalista responsável:
Marina Pastore – DRT 48378/SP
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