Como realizar a gestão de segurança de barragens?
Eventos climáticos extremos pedem aprimoramento no planejamento prévio, com estudos climatológicos e de vazões
Em agosto de 2024, a barragem da represa do condomínio de luxo Nasa Park, localizado entre Campo Grande e Jaraguari (MS), se rompeu. O desastre afetou principalmente os moradores da zona rural. O rompimento da barragem fez com que a água invadisse casas e parte da BR-163. Diante do ocorrido, como os aspectos de segurança das barragens são geridos no Brasil?
Situação das barragens brasileiras
De acordo com o banco de dados do Sistema Nacional de Informações sobre Segurança de Barragens (SNISB), que atualmente conta com 26.609 barragens cadastradas, 15,06% delas possuem uma taxa de dano potencial associado (DPA) alta, ou seja, em caso de rompimento, vazamento ou infiltração do solo, os riscos de impactos sociais, econômicos e ambientais (com perdas de vidas humanas) são elevados. No entanto, 53,71% das barragens brasileiras não foram classificadas quanto ao DPA. Já na classificação “Categoria de Risco” (CRI), que é determinada pela probabilidade de um acidente devido às características construtivas, de projeto, integridade da estrutura e de conservação das barragens, 10,99% estão classificadas como CRI Alto, 14,11% como CRI Médio, e 58,31% não foram classificadas.
Segundo o Relatório de Segurança de Barragens de 2023, a Secretaria do Meio Ambiente e Infraestrutura do Rio Grande do Sul (SEMA/RS) é o órgão fiscalizador com o maior número de barragens cadastradas no SNISB, com 10.219 (39,4% do total), seguida pelo Instituto de Meio Ambiente de Mato Grosso do Sul (IMASUL/MS), com 1.948 (7,5%), o Instituto Água e Terra do Paraná (IAT/PR), com 1.655 (6,4%), a Agência Nacional de Energia Elétrica (ANEEL), com 1.302 (5,0%), e a Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA), com 1.140 (4,4%).
Em relação aos 25 acidentes em barragens registrados em 2023, o Relatório de Segurança de Barragens de 2023 informa que em 23 deles (92%) houve associação com registro de chuvas intensas.
O relatório também apontou que, além do mecanismo de falha principal, em 17 registros de acidentes foram identificadas anomalias que contribuíram para a ocorrência dos acidentes e incidentes, destacando-se: erosão superficial, pipping/erosão regressiva, surgência a jusante, erosão no contato entre o maciço e a estrutura, e galgamento.
Vale lembrar que o relatório se refere ao ano de 2023, portanto ainda não inclui informações sobre as chuvas no Rio Grande do Sul em 2024.
Como fazer a segurança de barragens?
Filipe Sampaio, diretor da ANA, aponta que a segurança de barragens se caracteriza por um conjunto de ações preventivas e corretivas que visam manter a integridade estrutural e operacional da barragem, bem como a preservação da vida, da saúde, da propriedade e do meio ambiente. No Brasil, existe a Política Nacional de Segurança de Barragens (PNSB), regulamentada pela Lei Federal nº 12.334/2010.
De acordo com José Marques Filho, engenheiro e professor do Departamento de Construção Civil da Universidade Federal do Paraná (UFPR), devido às mudanças climáticas, as cheias em barragens tendem a se tornar cada vez mais frequentes. Por isso, é fundamental ter um planejamento prévio. “Como o amortecimento de cheias não foi planejado juntamente com a parte energética em anos anteriores, atualmente o regime e o manejo dos empreendimentos precisam ser reanalisados no Brasil. Nos últimos anos, o país construiu barragens a fio d’água, ou seja, sem armazenamento, o que dificulta o manejo de cheias, pois toda a água afluente é conduzida quase imediatamente para jusante”, explica.
Marques Filho destaca que é essencial a implementação de estudos climatológicos e de vazões para a previsão de eventos extremos, de forma a permitir que o poder público e os representantes da sociedade civil se preparem e minimizem os efeitos sobre as populações.
“É necessário estudar as obras, realizar análises de hidrologia e meteorologia, além de um estudo das cheias, juntamente com sistemas de monitoramento e alerta efetivos para mitigar os impactos sobre as populações. Somente após isso será possível determinar se a melhor solução é rearranjar os vertedouros, aumentar as barragens ou realizar um amortecimento, de preferência construindo novos empreendimentos com reservatórios. Na China, existem diversas barragens para amortecer cheias. O Brasil nunca deu muita atenção a isso”, afirma.
Outra possibilidade levantada por Marques Filho é a reorganização de populações em conjunto com as autoridades competentes, para evitar que elas ocupem regiões sujeitas a enchentes, de forma semelhante ao que ocorre quando se auxilia populações em áreas propensas a deslizamentos de terra.
Rompimento de barragem no Rio Grande do Sul
No Rio Grande do Sul, as barragens levantaram preocupações durante o período de chuvas intensas em maio de 2024. A barragem da Usina 14 de Julho teve um rompimento parcial em seu topo no dia 2 de maio. A Companhia Energética Rio das Antas (Ceran), responsável pela barragem, emitiu um comunicado informando que o rompimento parcial no topo da barragem não comprometeu sua estrutura.
“Os trabalhos de verificação continuam sendo realizados, mas até o momento os estudos indicam que a barragem é estável e segura para as vazões de projeto, e não há indicativos de risco de rompimento. A empresa está no processo de recuperação da barragem, dos acessos e das instalações, e reforça que qualquer alteração desse cenário será comunicada”, informou a Ceran.
Fontes
José Marques Filho, engenheiro e professor do Departamento de Construção Civil da Universidade Federal do Paraná (UFPR).
Filipe Sampaio, diretor da Agência Nacional de Águas e Saneamento Básico (ANA).
Jornalista responsável:
Marina Pastore – DRT 48378/SP
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