Com mão de obra e recursos abundantes, China vive era das megaconstruções

País ergueu em tempo recorde a maior ponte do mundo sobre o mar. No Brasil, entraves legais ainda impedem que se atinja esse nível de competitividade.

País ergueu em tempo recorde a maior ponte do mundo sobre o mar. No Brasil, entraves legais ainda impedem que se atinja esse nível de competitividade  

Por: Altair Santos

Os maiores empreendimentos de infraestrutura do mundo atualmente estão concentrados na China. O país tornou-se o centro das megaobras, como a recentemente inaugurada Ponte Qingdao Haiwan. Com 41,58 quilômetros, ela foi construída em quatro anos e cruza o golfo de Hangzhou, tornando-se a mais prodigiosa intervenção da engenharia sobre o mar. Projetada pelo Shandong Gausu Group, a ponte liga a cidade de Qingdao aos subúrbios da ilha de Huangdao, na baía de Jiaodhou.  

Alessandro Borges, diretor da ANEINFRA (Associação Nacional dos Analistas e Especialistas em Infraestrutura): China consegue construir tudo a baixo custo.

A megaobra custou o equivalente a R$ 85 milhões por quilômetro. O preço final foi de R$ 3,59 bilhões. Por cruzar um trecho de mar com fortes ondas, a ponte é sustentada por mais de 5 mil pilares e consumiu 450.000 toneladas de aço – o suficiente para quase 65 Torres Eiffel – e 2.300.000 metros cúbicos de concreto, o que daria para encher 3.800 piscinas olímpicas. Outro marco do empreendimento é o túnel submarino em que a ponte se transforma quando chega a Qingdao, percorrendo 3.950 metros abaixo do nível do mar. 

Depois desta obra, que foi inaugurada no final de junho de 2011, a China já se prepara para iniciar outro desafio à engenharia: em dezembro começará a construção da ponte que ligará Hong Kong a Macau, ao custo de quase R$ 15 bilhões. O valor é mais elevado do que o complexo Qingdao Haiwan, porque paralela à ponte haverá um corredor de transporte público (veículo leve sobre trilhos). O projeto terá 29,6 quilômetros de extensão, incluindo um túnel de 6,75 quilômetros. A previsão é que esse novo megaempreendimento fique pronto em 2016.  

Comparando com o Brasil, o tempo de construção e o custo das obras de infraestrutura na China são infinitamente menores. Um exemplo é a ponte sobre o rio Negro, em Manaus, que mede 3,6 quilômetros e começou a ser erguida em 2007 – mesmo ano da que liga Qingdao a Huangdao -, mas ainda não está pronta. A previsão é que seja inaugurada em outubro de 2011. Essa obra, a princípio orçada em R$ 574,8 milhões, não será concluída por menos de R$ 1,07 bilhão.  

Outro exemplo é o projeto da nova ponte sobre o rio Guaíba, em Porto Alegre, que ainda não saiu do papel. Com uma extensão de 2,9 quilômetros – catorze vezes menor do que a ponte chinesa – ela está orçada em R$ 1,16 bilhão e as obras devem durar no mínimo quatro anos. Para o engenheiro civil e diretor da ANEINFRA (Associação Nacional dos Analistas e Especialistas em Infraestrutura), Alessandro Borges, há vários aspectos que diferenciam a China e o Brasil quando o assunto são obras de infraestrutura. Entre eles, recursos, mão de obra e modelos legais para a viabilização de construções. É o que o especialista explica a seguir:  

A China inaugurou recentemente a maior ponte sobre o mar. Pelo tamanho da obra, foi construída em tempo recorde. Por que eles conseguem promover esse tipo de empreendimento com tanta eficiência e o Brasil não?

Essa eficiência da China para construir grandes obras de infraestrutura se deve, primeiro, à quantidade de recursos de que ela dispõe. Ela não precisa importar nada. Tem aço, cimento e outros insumos todos em casa. Por conta dessa indústria de base muito boa, o país consegue viabilizar obras a um custo bem mais barato.  

O que o Brasil precisaria para atingir tal nível de excelência?

A China tem 1,4 bilhão de habitantes e, consequentemente, uma mão de obra excedente e de baixíssimo custo. Eles ainda estão naquela transição de população rural, que ainda representa 40% dos chineses, para população urbana. Some-se a isso um sistema de contratação muito diferente do nosso. Aqui no Brasil a legislação trabalhista e o controle sobre uma obra, através do TCU (Tribunal de Contas da União), são muito rigorosos. O regime de contratação de obras deles é muito mais simplificado e a legislação ambiental quase inexiste. No nosso caso, temos uma das leis ambientais mais rígidas do mundo. Então, até que uma obra no Brasil consiga atender todas as exigências legais leva-se muito tempo. Isso é que torna a China mais competitiva.  

Além disso, quais os outros entraves que mais prejudicam as obras de infraestrutura no Brasil?

Em geral, as grandes construções de infraestrutura são intensivas em mão de obra. No Brasil, o custo por empregado é de 100% a 120% do salário dele, ou seja, você contrata uma pessoa por R$ 1.000,00 e o custo para o empregador vai ser de até R$ 2.200,00, incluindo aí Previdência Social, 13.º Salário, FGTS, COFINS, etc, e tudo isso recai como custo para o empregador e será repassado para a obra. Na China não tem sistema de previdência social. O empregado chinês não tem nenhuma garantia trabalhista. Se ele está empregado, está recebendo. Terminou a obra, não tem seguro-desemprego, não tem previdência social, não tem nada. Enquanto no Brasil a gente trabalha em níveis de valorização ao trabalho, na China o trabalhador não tem amparo nenhum. No Brasil, o amparo tem seu custo, tanto para aumentar o valor da mão de obra quanto para aumentar o custo da obra em si. Outro fator importante também é o chamado Custo Brasil (carga tributária alta, juros elevados e burocracia e corrupção) que chega a onerar uma construção em até 40%. Este custo na China está em torno de 15%. Então são componentes que contribuem muito para que no Brasil o custo de obra seja mais caro se comparado com a China.  

Ou seja, não há parâmetro de comparação que possam equiparar o Brasil ao atual nível de competitividade com a China.

Os parâmetros entre Brasil e China são muito distintos. Para mudar isso envolveria mudanças muito grandes na nossa regulamentação e na nossa legislação. Não se pode pensar hoje em mudar o nosso código ambiental de um dia para o outro sem ter um amplo debate. O Brasil é um país democrático e a democracia pressupõe que para se mudar as regras do jogo deve haver debate. Na China isso não é feito, porque o governo é centralizado, não existe uma democracia de fato. Um grupo decide e isso é imposto. Aqui no Brasil a gente tem que seguir os ritos democráticos. De qualquer forma, para acelerar as obras do PAC (Programa de Aceleração do Crescimento) o governo recentemente propôs o RDC (Regime Diferenciado de Contratação) que é uma forma de simplificação do regime de contratação para a Copa do Mundo e as Olimpíadas de 2016, que hoje é baseado na Lei 8.666/93, uma lei importantíssima, moralizadora e que trouxe rédeas curtas aos contratos de licitação. Mas a RDC tenta flexibilizar um pouco mais para que empreendimentos como o PAC andem mais rápido do que seria o normal. É uma ferramenta importante para se acelerar o processo licitatório no Brasil.   

Ponte sobre a baía de Jiaodhou, na China: 41,58 quilômetros em quatro anos.
A ponte é sustentada por mais de 5 mil pilares e sua construção consumiu 2.300.000 metros cúbicos de concreto.

Entrevistado

Alessandro Borges, diretor de comunicação da ANEINFRA (Associação Nacional dos Analistas e Especialistas em Infraestrutura) com sede em Brasília

Currículo

– Graduado em Engenharia Civil pela Universidade Federal de Goiás (1995)

– Pós graduado em Ciência da Computação  pela Universidade de Brasilia (2004)

– Pós graduado em Governança em Tecnologia da Informação pela UnICESP (2010)

– Analista de Infraestrutura da Secretaria de Planejamento e Investimentos Estratégicos, ligada ao Ministério do Planejamento, Orçamento e Gestão

– Diretor de Comunicação e Divulgação da Associação Nacional dos Analistas e Especialistas em Infraestrutura

Contato: alessandroborges@gmail.com  

Crédito: Divulgação  

Jornalista responsável: Altair Santos – MTB 2330


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