Cinza do bagaço da cana pode ser utilizada na produção de concreto

Parte da sílica presente na cinza tem condição de fortalecer a pasta endurecida

Para obter bons resultados na produção, a cinza precisa conter um teor baixo de matéria orgânica e possuir uma granulometria fina. Crédito: Victor Marcelo Estolano de Lima/UFPE

Um estudo elaborado por pesquisadores do Laboratório de Tecnologia dos Aglomerantes (LabTag), do Departamento de Engenharia Civil e Ambiental (Deciv) da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE), indicou a eficácia do uso das cinzas do bagaço da cana-de-açúcar (CBCA) como adição no preparo do concreto. Intitulada “Assessing the pozzolanic activity of sugarcane bagasse ash using X-ray diffraction”, a pesquisa mostrou que o material melhora a qualidade da mistura, uma vez que, a partir do refinamento dos poros e redução do ataque de agentes externos, reforçando a propriedade pozolânica, aquela que favorece a aderência e o endurecimento da solução.

De acordo com Victor Marcelo Estolano de Lima, um dos autores do estudo e doutorando em Engenharia Civil da UFPE, a cinza do bagaço da cana é um resíduo gerado pela queima do bagaço como biomassa, processo que visa a geração de energia elétrica para a própria usina. “Do ponto de viabilidade técnica, parte da sílica (SiO2) presente na cinza tem condição de reagir com produtos hidratados do cimento e fortalecer a pasta endurecida, sendo ela na argamassa ou concreto”, aponta Lima.

Condições ideais para o CBCA

Para obter bons resultados na produção, a cinza precisa conter um teor baixo de matéria orgânica e possuir uma granulometria fina, semelhante a um pó. “Para ser considerada uma pozolana, ou seja, uma adição em pó que melhora as propriedades do cimento e seus produtos, como argamassa e concreto, a norma brasileira NBR 12653 (Materiais pozolânicos — Requisitos) estabelece os critérios químicos e físicos para o material. Para atender a esses requisitos, temos visto tanto em nossas pesquisas como na literatura, que quase sempre é necessária a realização de uma nova calcinação para retirar a matéria orgânica residual, além de uma moagem para que a cinza alcance os parâmetros desejados de finura”, explica Lima.

Vantagens da Cinza do bagaço da cana

Cinza do bagaço da cana reforça a propriedade pozolânica, aquela que favorece a aderência e o endurecimento da solução.
Crédito: Victor Marcelo Estolano de Lima/UFPE

Lima menciona que existem dois grandes benefícios no uso da cinza como material cimentício: 

– Primeiro, você evita a circulação da cinza do bagaço como resíduo, que pode, na melhor das hipóteses, ser descartado em aterro sanitário. “No entanto, sabemos que o descarte ilegal é uma realidade. Isso ocorre porque a cinza não possui viabilidade como fertilizante para a agroindústria, por isso acaba sendo descartada”, comenta Lima. 

– O outro benefício diz respeito à diminuição de CO₂, quando você substitui o clínquer, que é o principal componente do cimento, pela cinza. “Numa conta grosseira, cada tonelada de clínquer libera cerca de 500 kg de CO2 na atmosfera. Substituir 10% de clínquer pela cinza já economizaria 50 kg de CO2 por tonelada, que numa escala industrial, é muito significativo. Em uma publicação realizada por Fairbairn et al. (2012), a redução de CO₂ causada pelo uso da cinza do bagaço no cimento, considerando a realidade do Estado de São Paulo, variaria entre 19.990 e 182.500 toneladas de CO2”, justifica. 

Viabilidade econômica para uso do CBCA

Do ponto de vista de viabilidade econômica, segundo Lima, ainda faltam estudos que coloquem custo em toda cadeia econômica que seria necessária para o beneficiamento, distribuição e aplicação da CBCA. “Isto já responde pelo fato de apesar de existirem muitas pesquisas na área, não termos conhecimento da utilização da cinza por cimenteiras ou concreteiras, pelo menos na região Nordeste”, afirma Lima.

Da mesma forma, o não-uso da cinza do bagaço ainda pode ocorrer por problemas logísticos. “O ideal é que a usina de cana fique próxima à cimenteira, diminuindo custos com transporte”, conclui Lima.

Entrevistado
Victor Marcelo Estolano de Lima é um dos autores do estudo e Doutorando em Engenharia Civil da UFPE. 

Contato
victor.estolano@ufpe.br

Jornalista responsável
Marina Pastore
DRT 48378/SP



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