Obras relevantes ao Rio Grande do Sul estão paradas

Nova ponte sobre o rio Guaíba e duplicação da BR-116 entre Porto Alegre e Pelotas sofrem com liberação de recursos a conta-gotas

Por: Altair Santos

Nova ponte sobre o Guaíba: fase das fundações está quase finalizada, mas contingenciamento prejudica
Nova ponte sobre o Guaíba: fase das fundações está quase finalizada, mas contingenciamento prejudica

Duas obras importantes para o Rio Grande do Sul - a nova ponte sobre o rio Guaíba e a duplicação da BR-116, entre Porto Alegre e Pelotas - só devem ficar prontas em 2021, desde que os recursos previstos voltem a ser liberados pelo governo federal. Os empreendimentos entraram no Programa de Aceleração do Crescimento, mas o dinheiro foi liberado a conta-gotas. Desde o ano passado, além de a verba não chegar, o orçamento começou a receber contingenciamento, ou seja, sofrer corte de gastos.

No caso da nova ponte sobre o rio Guaíba, dos R$ 229,5 milhões previstos houve corte de R$ 100 milhões. Já a duplicação da BR-116, orçada em R$ 140 milhões para um trecho de 230 quilômetros, teve R$ 50 milhões de seu orçamento suprimido e pode passar por mais ajustes. As comunidades gaúchas reclamam, mas o cenário não se mostra favorável. O receio dos que reivindicam a obra - entre eles, os organismos ligados à construção civil do Rio Grande do Sul - é de que os atrasos encareçam ainda mais o orçamento, podendo tornar mais difícil a viabilidade destas importantes obras de infraestrutura no estado.

Consciente de que há defasagem no calendário dos empreendimentos, o ministro do Planejamento, Dyogo Oliveira, afirma que a restrição fiscal é que impõe a dificuldade para a liberação de recursos. “São obras prioritárias, na medida do possível em que tenhamos recursos para viabilizá-las”, diz. Diante do impasse, o governo do Rio Grande do Sul não descarta trabalhar pela privatização das obras relevantes para a economia do estado.

Ponte em obras em Arroio Grande, no trecho da BR-116 entre Porto Alegre e Pelotas: à espera de verba
Ponte em obras em Arroio Grande, no trecho da BR-116 entre Porto Alegre e Pelotas: à espera de verba

Há um ano, em Brasília, a ideia foi semeada pelo secretário dos transportes do governo gaúcho, Pedro Westphalen. “A Ponte do Guaíba está paralisada, assim como outras obras federais, como a duplicação da BR-116. Precisamos achar uma solução, e concedendo para a iniciativa privada elas poderão ser concluídas”, disse.

Projeto e execução
Além da escassez de recursos, tanto a nova ponte sobre o Guaíba quanto a duplicação do trecho Porto Alegre-Pelotas enfrentam problemas de projeto e execução. No caso da BR-116, 59% estão concluídos, mas os trechos não foram interligados por falta de pontes, trevos e viadutos que não saíram do papel, além de entraves burocráticos. Se os trechos tivessem sido conectados, 90 quilômetros da duplicação já poderiam receber tráfego de veículos. Para resolver o impasse, uma das soluções também seria a privatização.

 

Pontes sem conclusão, como a que cruza o Arroio Evaristo, impedem que trechos duplicados sejam liberados ao tráfego
Pontes sem conclusão, como a que cruza o Arroio Evaristo, impedem que trechos duplicados sejam liberados ao tráfego

Quanto à nova ponte sobre o Guaíba, os debates sobre como deveria ser a estrutura consumiram recursos e tempo. A princípio projetou-se uma ponte estaiada com 1,9 quilômetro de cumprimento, mas concluiu-se que as torres atrapalhariam o tráfego aéreo do aeroporto Salgado Filho. Foi contratado um novo projeto, que chegou a uma solução sem estais, mas com 2,9 quilômetros de extensão e passando por trechos mais complicados para se construir.

Atualmente, a obra encontra-se próxima de finalizar a etapa das fundações, o que corresponde a 46,8% do projeto de execução. No entanto, o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura e Transporte) alega que se não houver a liberação de R$ 80 milhões em agosto terá de paralisar o ritmo por falta de recursos. “Esses R$ 80 milhões são para manter um volume mínimo de trabalho”, afirma o superintendente do DNIT no Rio Grande do Sul, Hiratan Pinheiro da Silva.

 

Entrevistados
Movimento Nova Ponte do Guaíba, Secretaria dos Transportes do Rio Grande do Sul, ministério do Planejamento, Desenvolvimento e Gestão e superintendência regional do DNIT no Rio Grande do Sul (via assessoria de imprensa)

Contatos
superintendencia.rs@dnit.gov.br
novaponteguaiba@gmail.com
gabinete@transportes.rs.gov.br
imprensa@planejamento.gov.br

Crédito Fotos: Consórcio Ponte do Guaíba e Ecosul

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Construção sustentável: ainda há muito para ser feito

Euro-ELECS 2017 revela que tanto as universidades quanto as empresas precisam entender que o tema sustentabilidade vai além das certificações

Por: Altair Santos

Realizado na Universidade do Vale do Rio dos Sinos (Unisinos), de 10 a 13 de maio de 2017, o Euro-ELECS 2017 teve como tema central “A sustentabilidade em tempos de transformação: desafios e oportunidades”. O evento tratou do assunto em 12 palestras e 236 artigos, nos quais foram debatidas questões referentes a materiais de construção, sistemas construtivos, projetos, meios produtivos, geração de energia, resíduos, mobilidade urbana e práticas sociais.

Campus da Unisinos, em São Leopoldo-RS, sediou o Euro-ELECS 2017
Campus da Unisinos, em São Leopoldo-RS, sediou o Euro-ELECS 2017

Promovido com o apoio da ANTAC (Associação Nacional de Tecnologia no Ambiente Construído), o Euro-ELECS 2017 teve a coordenação da professora doutora da Unisinos Andrea Parisi Kern. Engenheira civil com especialização em gestão, tecnologia e sustentabilidade, ela trata, na entrevista a seguir, de um dos assuntos debatidos no evento: como o tema sustentabilidade tem sido tratado no âmbito de escolas de arquitetura e engenharia civil. Confira:

Como o universo acadêmico, no âmbito de escolas de arquitetura e engenharia civil, encara o tema construção sustentável?
O tema está em pauta na academia e, devido à complexidade que envolve, deve ser tratado em todas as disciplinas, pois a sustentabilidade inclui desde a escolha dos materiais até o projeto e as questões urbanas. O assunto começou a ser discutido em programas de pós-graduação antes de chegar na graduação. Por exemplo, quando fiz a faculdade de engenharia civil, na década de 1990, as discussões em sala de aula eram extremamente pontuais e tímidas, embora na pós-graduação já existissem pesquisadores desenvolvendo trabalhos em construção mais sustentável. Hoje, o assunto já está na graduação e perpassa diferentes atividades.

Observa-se que as empresas (construtoras) estão cada vez mais focadas no tema sustentabilidade. O ambiente acadêmico acompanha essa transformação no mesmo ritmo?
Não acredito que seja uma regra nas empresas construtoras. Considero que algumas estão focadas, e muitas não. Observamos alguns avanços, mas há muito marketing, e também nada sendo feito. De forma geral, o cenário envolvendo empresas construtoras, fornecedores, projetistas, poder público e também a academia é crescente no sentido dos conceitos de sustentabilidade. Mas não afirmaria que as construtoras estão num ritmo mais acelerado, até porque a certificação, em muitos casos, é proposta por acadêmicos. Ainda existem muitos projetos contratados e executados que não se preocupam com as soluções passivas de conforto térmico, por exemplo. Além disso, ainda geram níveis altos de perdas e desperdícios nos canteiros e aceitam a informalidade na contratação da mão de obra. Temos um longo caminho a ser percorrido, ainda que iniciativas em prol da construção sustentável estejam sendo realizadas.

Andrea Parisi Kern: certificações não garantem que a construção seja sustentável
Andrea Parisi Kern: certificações não garantem que a construção seja sustentável

O Brasil hoje aparece entre os cinco países que mais possuem obras certificadas com selos de construção sustentável. Isso motiva a academia (universidades) a pensar em incluir mais disciplinas voltadas para esse tema?
É bom esclarecer: um prédio certificado indica que alcançou alguns requisitos de sustentabilidade propostos pelo programa de certificação, mas não garante que seja uma construção sustentável. Pode ser um caminho para a sustentabilidade, e certamente é um caminho para o marketing da sustentabilidade. As certificações estrangeiras, por exemplo, são extremamente caras e inacessíveis para uma grande parcela das construções. Muitas vezes, independentemente de certificações, soluções de projeto, de produção, de uso de materiais bem aplicadas podem conferir excelentes resultados em termos de diminuição de consumo de recursos naturais e permeabilidade do terreno. Não considero que as certificações tenham motivado a academia a pensar na sustentabilidade, mas sim os impactos ambientais decorrentes do setor da construção. Acredito em certificações, porém acredito também em legislação, em fiscalização, em conscientização.

Como os graduandos têm saído das escolas de arquitetura e de engenharia civil em termos de conhecimento sobre construção sustentável?
Embora haja muito ainda para ser feito, acredito que os graduandos saem com uma consciência cada vez maior, pois esse assunto está crescentemente em pauta. Da mesma forma, tanto engenheiros civis quanto arquitetos têm demonstrado cada vez mais interesse pelo tema sustentabilidade na construção civil.

Já está definido o próximo Euro-ELECS, e qual tema será abordado?
O próximo Euro-ELECS será na Argentina, em 2019, mas ainda não foi definido o tema.

Entrevistada
Engenheira civil Andrea Parisi Kern, professora doutora da Unisinos, com especialidade em gestão, tecnologia e sustentabilidade

Contatos
apkern@unisinos.br
euro-elecs2017@unisinos.br

Crédito Fotos: Unisinos

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Custo da informalidade pode sair mais caro do que parece

Pesquisa revela que atores menores da cadeia produtiva da construção civil são mais suscetíveis a práticas em desacordo com a legislação

Por: Altair Santos

Em 2006, por encomenda da ABRAMAT (Associação Brasileira da Indústria de Materiais de Construção) e do Etco (Instituto Brasileiro de Ética Concorrencial), a Fundação Getúlio Vargas (FGV) realizou estudo sobre a informalidade na cadeia produtiva da construção civil. Na época, constatou-se que, dependendo do setor produtivo da construção civil, a informalidade variava entre 27,6% e 60,8%. Passada mais de uma década, o cenário mudou pouco. É o que mostra a pesquisa “Impacto da informalidade e do investimento em responsabilidade social na indústria da construção”. O trabalho, coordenado pelos pesquisadores Rafael Tello, Fabiana Ribeiro e Marina Araújo, é da NHK Sustentabilidade, em parceria com a Fundação Dom Cabral, e foi apresentado no 89º ENIC (Encontro Nacional da Indústria da Construção), de 24 a 26 de maio de 2017, em Brasília. Veja o dizem os pesquisadores:

Rafael Tello afirma que informalidade está mais concentrada nas empresas prestadoras de serviço
Rafael Tello afirma que informalidade está mais concentrada nas empresas prestadoras de serviço

Quais os pontos mais relevantes que a pesquisa “Impacto da informalidade e do investimento em responsabilidade social na indústria da construção” revela?
A pesquisa conta com uma etapa qualitativa e outra quantitativa, consultando profissionais de 11 estados do Brasil. No levantamento, identificamos que a informalidade no Brasil ultrapassa os 2 milhões de trabalhadores, 10% a menos que os 2,2 milhões de postos de trabalho formais estimados por nossa pesquisa. O trabalho informal está distribuído em empresas e na prestação de serviços para pessoas físicas que realizam a autoconstrução. Percebemos que a informalidade é resultado de um conjunto de incentivos, que direcionam a ação dos atores da construção:

Do lado da empresa, observamos:
- Risco: possibilidade da empresa receber multas, ter sua imagem e reputação prejudicadas e sofrer revezes financeiros, como maior dificuldade de obtenção de crédito. Quanto maior a empresa, maior sua preocupação com esse risco.
- Recursos: o controle de fornecedores é oneroso e demanda equipes grandes e dedicadas. Por isso, empresas menores têm dificuldade de alocar os recursos necessários para a fiscalização efetiva de terceirizados.
- Pressão: a indústria da construção possui um conjunto de atores de diferentes portes e poder de negociação. Assim, a pressão que as organizações sofrem para redução de custos e prazos de entrega exerce influência na decisão de adotar os processos legais para a contratação de trabalhadores formais. Normalmente, a pressão se concentra nos menores atores da cadeia, especialmente empreiteiros.

Já do lado dos trabalhadores, identificamos:
- Renda disponível: os trabalhadores classificam como renda, o dinheiro que recebem diretamente ao final do mês ou serviço. Ganhos indiretos e benefícios não são percebidos como renda por boa parte dos entrevistados. Percebeu-se que trabalhadores com desejo de maior renda disponível têm a tendência a buscar o trabalho informal.
- Segurança: o trabalho formal traz uma série de direitos para o trabalhador, como FGTS, contribuição para a previdência e seguro desemprego. Além disso, diversas empresas complementam esses direitos com benefícios para seus profissionais e, por vezes, suas famílias. A valorização da segurança oferecida por esses direitos e benefícios incentiva a busca de trabalho formal pelos trabalhadores.
- Autonomia: há uma percepção difundida no mercado de que trabalhadores informais gozam de autonomia para definirem seus horários de trabalho e firmarem contratos que remunerem entregas rápidas. Os trabalhadores que buscam grande volume de trabalho como meio para aumento de renda, tendem a buscar a autonomia permitida pela informalidade.

Apresentação da pesquisa na 89ª edição do ENIC: setor teve contato com números que desconhecia
Apresentação da pesquisa na 89ª edição do ENIC: setor teve contato com números que desconhecia

Os resultados da pesquisa sugerem que ações de combate aos incentivos de ambos os lados podem complementar ações de fiscalização e punição de empresas. Como último dado relevante sobre a informalidade, calculamos que 1,4 milhão de trabalhadores informais não contribuem com a Previdência. Isso representa perda mensal de mais de R$ 500 milhões em contribuições, e um passivo que compromete a capacidade de financiamento do sistema no longo prazo.

A pesquisa foi apresentada na 89ª edição do ENIC. Qual o impacto que ela causou?
A informalidade é uma realidade no setor da construção e seu combate tem sido pouco eficaz. Os dados sobre o nível da informalidade assustam, mas não surpreendem, pois pesquisas prévias também apontam para nível semelhante de informalidade no mercado. A explicitação de alguns incentivos para a informalidade foi bem recebida pelos espectadores. A boa compreensão das raízes da informalidade e seus mecanismos foram vistos como chave para o efetivo combate ao problema. Um dado que surpreendeu a audiência foi a baixa taxa de respostas obtida na pesquisa. Devido à crise econômica, boa parte dos trabalhadores consultados havia perdido seu emprego formal e encontrava-se desempregada ou atuando na informalidade. Apenas dois de cada 30 trabalhadores consultados seguia atuando no mercado formal.

A informalidade de que trata a pesquisa é referente apenas ao uso de mão de obra ou se estende à cadeia produtiva também?
Observamos a informalidade na cadeia produtiva. Verificou-se que nas médias e grandes organizações, quando a informalidade acontece, ela está concentrada em empresas prestadoras de serviços. Essas são empresas regularizadas, com impostos em dia, mas cujas relações de trabalho não seguem as regras da CLT. Foram relatadas ações para burlar a fiscalização das contratantes, como falsa declaração de cumprimento de convenção coletiva e registro de funcionário diferente do real prestador de serviços, entre outras. Os limites da pesquisa foram empresas de construção. Assim, não avançamos na análise de fornecedores de materiais.

Quais setores da construção são mais vulneráveis à informalidade?
De modo geral, observamos que quanto menor o poder de negociação da empresa, maior é a sua possibilidade de utilizar trabalho informal. Isso porque, essa forma de relação profissional é mais rápida de ser estabelecida e tem menor custo para a empresa. Como essa pressão se concentra sobre organizações menores, que também são menos expostas ao risco de punição, forma-se uma combinação de incentivos que leva à informalidade. Na pesquisa não buscamos analisar o segmento de autoconstrução. No entanto, foi comum escutar nas quase 300 entrevistas conduzidas que os trabalhadores informais atuam fortemente nesse tipo de obra.

Existe uma cifra de quanto a informalidade causa de prejuízo em arrecadação e também em qualidade na construção?
Quanto à arrecadação, calculamos dois números principais. Mensalmente, a renda total auferida por trabalhadores informais está em torno de R$ 6,5 bilhões. Como 71% desses profissionais não contribuem com a Previdência, há uma perda mensal estimada de mais de R$ 500 milhões em contribuições. Com relação à qualidade não conseguimos chegar a números conclusivos, mas constatou-se que a mão de obra informal tem menor escolaridade e menor acesso a cursos de capacitação. Esses dados sugerem que a qualidade do trabalho desses profissionais tende a ser menor que a dos trabalhadores formais.

Sob o ponto de vista em investimento em responsabilidade social, o que ela representa para a indústria da construção?
Observou-se que a indústria segue o mesmo padrão da média das empresas brasileiras consultadas na pesquisa “O Estado da Sustentabilidade das Empresas Brasileiras”, da Fundação Dom Cabral. Isto é, há um grande hiato entre discurso e prática. Do lado do discurso, quase a totalidade das empresas da indústria da construção se dizem preocupadas e atentas às questões de Responsabilidade Social Corporativa (RSC). Porém, apenas uma fração delas reporta a consideração da RSC em seu planejamento estratégico e a existência de metas de desempenho social e ambiental e indicadores para monitoramento. O dado preocupante é que a Indústria da construção apresenta níveis de atuação entre 50% e 75% menores que a média das empresas da pesquisa da FDC, o que indica que as empresas de construção ainda se encontram em um estado de maturidade no qual buscam cumprir a legislação e alcançar pequenos ganhos de reputação com ações básicas de RSC, como doações e campanhas educativas.

Em situação de crise, caem investimentos em responsabilidade social e aumenta a informalidade?
Não conseguimos chegar a números que confirmem isso. A pesquisa, comparando os relatórios de sustentabilidade das empresas da indústria da construção, mostra uma grande queda no número de relatórios publicados após 2014. Com relação à informalidade, observamos alto volume de trabalhadores que deixaram o mercado formal e que estão atuando como informais, mas não conseguimos estimar o grau desse fenômeno. Além disso, captamos que mais de 20% dos trabalhadores buscam outras atividades para aumento de renda, muitas vezes atuando na informalidade. Infelizmente, não temos uma série histórica que nos permita comparar esse nível com o de outros períodos.

Como convencer o empresário do setor a investir em responsabilidade social e mecanismos de combate à informalidade?
Cerca da metade dos representantes de empresas consultados já reconhece que a RSC pode trazer economia de custos e vantagens competitivas para as empresas. Mais de 60% deles dizem que a RSC é importante para seus clientes. Isso mostra que está acontecendo um entendimento da importância da RSC para os negócios. É o principal meio para que as empresas se engajem com o assunto e busquem implementá-lo em suas atividades, como uma forma de melhorar seus resultados. Como citado anteriormente, o combate à informalidade é caro e difícil, especialmente para empresas de pequeno porte. É preciso que o empresário compreenda o risco de uso da mão de obra informal e os potenciais impactos para seus negócios. Também é preciso baratear as atividades de fiscalização, para que as empresas, especialmente as de pequeno porte, possam deixar de apenas gerir documentação, e passem a efetivamente eliminar a informalidade de seus quadros e dos seus fornecedores diretos.

A cadeia produtiva da construção já superou anomalias com trabalho escravo ou ainda é possível encontrar situações como essa em pleno século 21?
Esse é um ponto muito polêmico. Empresas da indústria da construção foram incluídas na lista de trabalho escravo no passado recente. Porém, algumas delas conseguiram provar na justiça que essa inclusão não se justificava, uma vez que os problemas identificados eram ligados a questões de saúde e segurança no trabalho e não de exploração ilegal da mão de obra, o que muda o tratamento e punição a serem dados para a empresa. Não tenho informações suficientes para afirmar que não há trabalho escravo na indústria, especialmente devido à sua vasta abrangência e variedade. No entanto, como opinião pessoal, acredito que enquanto a efetiva fiscalização de fornecedores e de alojamento não for prática comum na indústria da construção brasileira, teremos novos casos de denúncias de trabalho análogo à escravidão em empresas do setor, e a continuidade da percepção pelo grande público, e pelo mercado, de que a construção é arcaica, antiética e exploradora, gerando uma série de impactos negativos para todos os seus atores.

Entrevistado
Economista Rafael Tello, graduado pela UFMG, especializado em negócios Internacionais pela Fundação Dom Cabral, com MBA em gestão da sustentabilidade pela Leuphana Universität (Lüneburg)

Contatos
rafael.tello@nhksustentabilidade.com.br
marina.araujo@nhksustentabilidade.com.br
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Crédito Fotos: NHK Sustentabilidade e Teresa Sá/CBIC

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Moradigna vai aonde Minha Casa Minha Vida não chega

Startup criada na Universidade Mackenzie se especializou em recuperar moradias insalubres na periferia da cidade de São Paulo

Por: Altair Santos

Vivian Sória, Matheus Cardoso e Rafael Veiga: Moradigna atende famílias renegadas pelo MCMV
Vivian Sória, Matheus Cardoso e Rafael Veiga: Moradigna atende famílias renegadas pelo MCMV

Uma startup criada dentro da Universidade Mackenzie, em 2015, foi o embrião para que o engenheiro civil Matheus Cardoso criasse a Moradigna. Ele juntou sua expertise à da arquiteta Vivian Sória e à do contabilista Rafael Veiga para apontar sua construtora na direção do empreendedorismo social. “Não somos uma ONG (Organização Não-Governamental)”, dizem, afirmando que o objetivo da empresa é reformar casas insalubres.

O campo de ação da Moradigna é a Vila Pantanal, na região leste da cidade de São Paulo. Desde a criação da empresa, 220 famílias já foram atendidas. Atualmente, em média, são realizadas 25 reformas por mês. A maior demanda, explica Vivian Sória, está na recuperação de banheiros. “Eles são construídos sem nenhum revestimento, as paredes escurecem e o mofo costuma tomar conta do ambiente”, afirma. Após as reformas, as famílias beneficiadas dizem ter reduzido o número de doenças respiratórias, como gripe, resfriado, renite, bronquite e asma.

A Moradigna não realiza intervenções nas estruturas das casas, que, em quase sua totalidade, são obras de autoconstrução. O objetivo é seguir a missão da empresa, que é dar dignidade às casas em condições insalubres. “Se tivesse que reformar estruturalmente as residências, seria mais fácil colocá-las abaixo e construir casas novas. O que o Moradigna faz é avaliar se a casa comporta reformas. Existem muitas casas com problemas estruturais, mas em estrutura a gente não mexe”, revelam os sócios da startup.

Imagens mostram o antes e o depois das intervenções do Moradigna
Imagens mostram o antes e o depois das intervenções do Moradigna

Para baratear os custos, a equipe do Moradigna treina a mão de obra local, gerando emprego dentro da própria Vila Pantanal. Assim, cada reforma custa R$ 4 mil, em média. Os moradores podem pagar em 12 vezes, sem acréscimo de juros. A única exigência é que a família comprove ter renda mensal de R$ 1.500,00. Os recursos para o Moradigna vêm de duas fontes: a própria parceria com as famílias ou através do Instituto PHI (Filantropia Inteligente) que subsidia as reformas para famílias das classes D e E que não têm condições de pagar.

Cartão Reforma da Caixa
Existe a expectativa de que o Moradigna passe a receber investimento do programa Inova Capital - Programa de Apoio a Empreendedores Afro-Brasileiros -, e que possui uma linha de crédito do Banco Interamericano de Desenvolvimento (BID), mas isso ainda não ocorreu. Para aumentar o potencial de financiamento de suas reformas, o Moradigna também espera que o Cartão Reforma Caixa possa ser usado pelas famílias nas reformas. “Estamos estudando esta possiblidade, mas por enquanto não temos a opção da Caixa”, comenta Vivian Sória.

Imagens mostram o antes e o depois das intervenções do Moradigna
Vila Pantanal, na zona leste de São Paulo: ações do Moradigna ajudam a minimizar precariedades

Em vigor desde maio de 2017, o Cartão Reforma da Caixa é voltado para famílias de baixa renda que recebem até três salários mínimos - o equivalente a R$ 2,8 mil. Elas têm acesso ao crédito para reforma, ampliação, promoção da acessibilidade ou conclusão de obras. O programa tem orçamento de R$ 1 bilhão e espera beneficiar 100 mil famílias. O limite de crédito para a aquisição do material de construção é de R$ 5 mil.

O fato de boa parte das casas atendidas pelo Moradigna estar em áreas de ocupação e em terrenos irregulares dificulta o acesso a financiamentos oficiais e também a chegada do programa Minha Casa Minha Vida em localidades como a Vila Pantanal. “Por essas questões, o Minha Casa Minha Vida não pode construir lá”, afirmam os idealizadores do Moradigna, que diante deste empecilho só vêem crescer a demanda por reformas em casas insalubres.

 

Entrevistado
Engenheiro civil Matheus Cardoso, arquiteta Vivian Sória e contabilista Rafael Veiga, sócios da Moradigna

Contatos
contato@moradigna.com.br
www.moradigna.com.br

Crédito Fotos: Moradigna

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

PR e SC são únicos estados com pontes inspecionadas

Parceria entre UFPR e DNIT permite mapeamento de obras de arte em estradas paranaenses e catarinenses. Modelo será levado para todo o país

Por: Altair Santos

Parceria estabelecida em 2014 entre a Universidade Federal do Paraná (UFPR) e o DNIT (Departamento Nacional de Infraestrutura de Transportes) permitiu que Paraná e Santa Catarina saíssem na frente na intenção do organismo federal de mapear e inspecionar todas as pontes existentes no Brasil, que estejam sob sua jurisdição. Hoje, os dois estados são os únicos que sabem em que situação se encontram suas obras de arte rodoviárias, cumprindo o que exige a ABNT NBR 9452:2016 - Inspeção de pontes, viadutos e passarelas de concreto.

Mauro Lacerda Santos Filho: principal patologia nas pontes do Paraná é a corrosão de armadura por desplacamento
Mauro Lacerda Santos Filho: principal patologia nas pontes do Paraná é a corrosão de armadura por desplacamento

O trabalho realizado pela UFPR engajou o Escritório Modelo de Engenharia Civil (EMEA) da Universidade de onde participam alunos de graduação e de pós-graduação. Eles precisaram ir a campo para prospectar em que condições estavam as pontes paranaenses e catarinenses em rodovias sob a gestão do DNIT. A coordenação do trabalho esteve a cargo do professor-doutor do departamento de engenharia civil da UFPR, Mauro Lacerda Santos Filho. Em palestra no Simpósio Paranaense de Patologia das Construções, que ocorreu de 29 de maio a 2 de junho, no centro politécnico da UFPR, ele explicou como se deu o trabalho.

Mauro Lacerda Santos Filho revelou que sequer o DNIT sabia o número exato de pontes nos dois estados. “O DNIT passou lista de 128 pontes no Paraná, mas após o mapeamento detectou-se que havia mais pontes: 190”, disse o professor, completando que o trabalho mais difícil foi conseguir descobrir como as pontes haviam sido construídas. “Como fazer um programa de conservação daquilo que não se sabe como foi feito? Boa parte das pontes foi executada nos anos 1960 e seus projetos já não existem mais. Foi preciso pesquisar como era feito o concreto naquela época, qual a qualidades dos materiais, o tipo de execução e até as condições ambientais e climáticas de quase 60 anos atrás”, explica.

Banco de dados de pontes
O trabalho do grupo de estudantes de engenharia civil que foi a campo procurou diagnosticar os seguintes aspectos das pontes: elementos estruturais, elementos críticos, importância da ponte no sistema viário e o custo para reparar o elemento com patologia ou para substituir a ponte, caso não fosse possível recuperá-la. A partir das informações coletadas, foi criado um sistema de gestão de pontes, e que foi aplicado nos dois estados: Paraná e Santa Catarina. “São os únicos estados que têm banco de dados de pontes no país”, diz Mauro Lacerda Santos Filho.

Ao todo, foram inspecionadas 553 pontes (190 no Paraná e 363 em Santa Catarina) sob a jurisdição do DNIT. Nas estradas paranaenses, o professor da UFPR afirmou que as patologias mais comuns são corrosão de armadura por desplacamento, seguido de manchas de umidade. “Mesmo assim, Paraná e Santa Catarina têm poucas pontes em péssimas condições, em comparação ao que se vê em outras regiões do país. Tem pontes em operação que estão sustentadas por escoramento de bambu no Brasil”, afirma Mauro Lacerda Santos Filho. Os dois estados são também os únicos que atendem um dos principais requisitos da ABNT NBR 9452:2016, que é a inspeção das obras de arte rodoviárias de dois em dois anos.

Saiba mais sobre a ABNT NBR 9452:2016, clique aqui.

Entrevistado
Engenheiro civil Mauro Lacerda Santos Filho, professor-doutor da Universidade Federal do Paraná e especialista nos seguintes temas: patologia das edificações, sistema de gerenciamento de pontes e performance estrutural

Contato
maurolacerda@ufpr.br

Crédito Foto: Cia de Cimento Itambé

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Investigar patologia em fachada é trabalho para “detetive”

Professor-doutor Angelo Just da Costa Silva apresenta roteiro de como detectar problemas em revestimento de paredes externas

Por: Altair Santos

As fachadas com revestimento cerâmico estão entre os sistemas construtivos que mais apresentam patologias. Não é à toa que a norma técnica que trata do tema passa por um processo minucioso de revisão. A nova ABNT NBR 13755 - Revestimento de paredes externas e fachadas com placas cerâmicas e com utilização de argamassa colante - Procedimento - pretende valorizar o detalhamento da execução, aumentando o controle antes, durante e depois da obra. Também se torna mais rigorosa com relação aos ensaios de resistência superficial, incluindo critérios de aceitação. A expectativa é de que a norma revisada seja publicada ainda em 2017.

Angelo Just da Costa Silva: investigação minuciosa garante recuperações mais precisas
Angelo Just da Costa Silva: investigação minuciosa garante recuperações mais precisas

A ABNT NBR 13755 é uma norma técnica cujo texto original tem dez anos. Sem as devidas atualizações, engenheiros que trabalham em inspeção de fachadas para detectar patologias devem atuar como verdadeiros “detetives”, explica Angelo Just da Costa Silva, professor-doutor da Universidade Federal de Pernambuco e da Universidade Católica de Pernambuco. O engenheiro civil palestrou no Simpósio Paranaense de Patologia das Construções, que ocorreu de 29 de maio a 2 de junho, no centro politécnico da UFPR. Ele procurou passar um roteiro de como investigar patologias em fachadas, e que inclui descrição do edifício, histórico do problema, ensaios, diagnóstico das causas e alternativas para recuperação.

Veja as mais importantes dicas dadas por Angelo Just da Costa Silva:

- Descrição do edifício
“Engenheiros, infelizmente, ainda têm dificuldades em gerar documentos sobre as edificações que constroem. Por isso, quem investiga a patologia tem que atuar como um detetive. É fundamental saber o ano de conclusão do edifício, quem construiu, materiais usados e técnicas utilizadas na obra da fachada. Quanto maior o número de informações em relação ao prédio, mais fácil de encontrar as causas prováveis.”

- Histórico do problema
“É importante verificar a área estimada da patologia, como ela está evoluindo, e como começou o problema. Em alguns casos, o edifício já passou por algum tipo de intervenção na fachada, mas as pessoas que contratam a inspeção não sabem dizer. Isso é relevante diagnosticar, pois se já houve outra intervenção no prédio é possível que a patologia esteja se repetindo, principalmente quando o revestimento cerâmico aplicado foi executado com as mesmas técnicas e usou os mesmos materiais.”

- Ensaios
“É importante comunicar a quem contratou a inspeção que ensaios podem ser custosos e que também são destrutivos, ou seja, será preciso quebrar a fachada, a qual, obviamente, depois será reparada. Mas os ensaios são imprescindíveis, pois são eles que vão responder se o condomínio terá de trocar a cerâmica que está caindo ou vai precisar trocar todo o revestimento do edifício. Há dois tipos de ensaios, e o ideal é que sejam aplicados em conjunto. Um deles é o ensaio de aderência em laboratório, que é mais preciso, porém com amostragem baixa. Já o ensaio de percussão, que é feito manualmente por operários, é menos preciso, mas com amostragem maior. Esses ensaios vão mostrar valores de ruptura e tipos de ruptura no revestimento.”

- Diagnóstico das causas prováveis
“As causas mais comuns passam por erros de projeto, uso de materiais inadequados, problemas na execução ou falta de manutenção. Se for projeto, a falha mais comum é a falta de juntas de movimentação na região de ancoramento entre a viga e a alvenaria. Se for problema com materiais, a argamassa colante pode ser a grande vilã. No caso da execução, o desaprumo é o erro mais comum.”

- Alternativas recomendadas para recuperação
“A partir do laudo, a tomada de decisão é do condomínio, com base no que a inspeção vai dizer. Se o prédio foi construído com concreto de alta resistência, onde a porosidade e a permeabilidade são baixas, será recomendado fazer um tratamento de superfície antes de reinstalar a fachada. Vai orientar ainda que se o prédio foi construído com bloco cerâmico o tratamento da aderência da fachada será um e se foi com bloco de concreto será outro. Também é importante que a mão de obra que vai atuar na fachada tenha treinamento. Outro fator importante que foi agregado recentemente é a Norma de Desempenho (ABNT NBR 15575). Ela traz mudanças, pois separa a vida útil da fachada da vida útil do prédio. A da fachada é menor, o que obriga operações de manutenção.”

Entrevistado
Engenheiro civil Angelo Just da Costa Silva, professor-doutor da Universidade Federal de Pernambuco (UFPE) e da Universidade Católica de Pernambuco, e diretor-técnico da Tecomat Engenharia Ltda.

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angelo@unicap.br

Crédito Foto: Cia de Cimento Itambé

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Projetos precisam evitar sondagens empíricas

Professor da UFPR, Eduardo Dell’Avanzi aponta erros mais comuns em obras, principalmente no que se refere a estudos geológicos e fundações

Por: Altair Santos

O estudo das características geológicas do terreno é decisivo para que o projeto das fundações de uma obra não resulte em problemas futuros. Esta foi uma das abordagens da palestra do professor-adjunto do departamento de engenharia civil da Universidade Federal do Paraná, Eduardo Dell’Avanzi, durante o Simpósio Paranaense de Patologia das Construções, que ocorreu de 29 de maio a 2 de junho, no centro politécnico da UFPR. Engenheiro civil com ênfase em geotécnica, Eduardo Dell’Avanzi destacou que conhecer o terreno é apenas um dos passos para se garantir uma construção sem risco de patologias em fundações. “Além de evitar erros na sondagem do solo, há outros três erros que se deve evitar: o de execução, o de especificações de material e o de comunicação”, alerta.

Eduardo Dell’Avanzi: todo projeto deve ter gerenciamento de risco
Eduardo Dell’Avanzi: todo projeto deve ter gerenciamento de risco

Com experiência em projetos, o professor da UFPR afirmou que há “pequenos vícios” implícitos em obras, e que geralmente resultam em patologias. Um dos mais perigosos é não tratar a obra de forma racional. O que Eduardo Dell’Avanzi quer dizer é que um projeto que tenha passado por auditoria e que esteja embasado em ensaios de laboratório tem chances bem menores de apresentar erro. “Já as sondagens empíricas, e que podem ser assumidas como verdadeiras, são as que mais colocam em risco um projeto. Isso pode ocorrer quando o executor, para ganhar tempo, decide não seguir o projeto de execução. Outro erro grave é quando não são seguidas as especificações do concreto definidas em projeto. São erros que geram incertezas na obra”, define.

Em sua palestra, Eduardo Dell’Avanzi cita que há três tipos de pressões que podem desencadear patologias. Uma delas é a imposição econômica. “Quando o dono da obra pressiona por busca de soluções mais baratas, isso pode comprometer o projeto”, cita. Outro fator é a preponderância do aspecto político sobre o aspecto técnico, o que, geralmente, ocorre em obras públicas. Dell’Avanzi destaca ainda a falta de tempo hábil para o entendimento de todas as variáveis envolvidas no projeto. “Essa pressão pela entrega do projeto acaba fazendo com que se criem anteprojetos, pré-projetos, ou seja, projetos inconclusos, não definitivos, e que podem gerar erros no momento da execução, principalmente em questões envolvendo apoio e sobrecarga”, afirma.

Maturação do projeto
Eduardo Dell’Avanzi reforça que é preciso evitar decisões subjetivas e precipitadas em uma obra. “O recomendável é que haja protocolos de análise para ajudar a checar o que está sendo feito. Para isso, às vezes, é necessário um período de maturação do projeto, acompanhado de um plano de gerenciamento de risco, o que permitirá que o engenheiro que vai executar a obra possa analisar com mais critérios se o cenário da construção está dentro da normalidade ou em um cenário de atenção ou de risco.

Também é importante dizer que o gerenciamento de risco é relevante, pois é ele quem vai definir o que cada um deve fazer em uma situação de emergência”, destaca o professor da UFPR, lembrando que em sua área de atuação três normas técnicas são fundamentais: ABNT NBR 6122 – Projeto e execução de fundações; ABNT NBR 9061 - Segurança de escavação a céu aberto, e ABNT NBR 11682 - Estabilidade de Taludes.

Entrevistado
Professor-doutor Eduardo Dell’Avanzi, do departamento de engenharia civil da UFPR, e sócio-fundador da EFEL Engenharia

Contato
avanzi@ufpr.br

Crédito Foto: Cia de Cimento Itambé

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Brasil tem centenas de patologias em fundações. Por quê?

Ausência de investigação do subsolo e ensaios inadequados são os fatores que mais desencadeiam esse problema na construção civil

Por: Altair Santos

O professor-doutor do departamento de engenharia civil da UFRGS (Universidade Federal do Rio Grande do Sul), Fernando Schnaid, começou sua palestra no Simpósio Paranaense de Patologia das Construções com a seguinte pergunta: existem problemas de patologias em fundações no Brasil? Ele mesmo deu a resposta: “Sim, às centenas”. E por quê? Segundo o especialista, por causa de falhas na investigação do subsolo para obras da construção civil e, em alguns casos, por ausência de qualquer tipo de ensaio.

Fernando Schnaid: qualidade das fundações está diretamente relacionada com os ensaios do subsolo
Fernando Schnaid: qualidade das fundações está diretamente relacionada com os ensaios do subsolo

No evento realizado no centro politécnico da UFPR, que aconteceu de 29 de maio a 2 de junho, Schnaid revelou que 6% das patologias que afetam as construções no país estão associadas a fundações. “Só 6%? Parece pouco, mas não é. A razão é que as consequências econômicas e de risco destes problemas são extraordinários frente a outras patologias, que geralmente são localizadas e cujas soluções são relativamente fáceis. Já os problemas com fundações podem gerar custos quase do tamanho da edificação a que elas dão suporte”, destaca.

O professor Fernando Schnaid lembrou que a qualidade das fundações está diretamente relacionada com os ensaios do subsolo. Mesmo assim, a ausência de investigação ainda ocorre no Brasil. “É uma prática inaceitável, mas há quem ainda faça isso. Quando? Normalmente, em edifícios de pequeno porte”, revela. Há casos em que ocorre a investigação, mas a interpretação dos resultados é errada. Segundo o especialista, este tipo de falha aumentou com a crise econômica no país.

Crise afeta geotecnia
Para Schnaid, os problemas pelos quais passa o Brasil, afetando diretamente o mercado da construção civil, têm causado degradação no serviço de análise geotécnica. “Isso se deve a uma cadeia de terceirização deste tipo de serviço, a fim de baratear custos. O que pode ocorrer, e ocorre, é que uma ponta faz boa investigação, mas a outra não sabe interpretar. E em geotecnia, as interpretações precisam passar confiança para que se possa praticar uma boa engenharia”, afirma.

Em sua palestra, o professor da UFRGS voltou a ressaltar que aspectos relacionados com a investigação das características do subsolo são a causa mais frequente de problemas com fundações. “Quem diz isso? O código europeu (EuroCode) diz, a norma francesa diz, enfim, a prática internacional diz isso. Na maioria das vezes em que ocorrem patologias em fundações, o problema não está no projeto, mas nas falhas de investigação das características do solo”, frisa Schnaid.

O especialista reforça ainda que não é por falta de tecnologia em geotecnia que esses erros ocorrem no país. “Existe uma variedade extraordinária de ensaios de subsolo no Brasil. Mas um grande número de projetos concentra-se na sondagem de simples reconhecimento (spt). Mesmo o DNIT e a Petrobras exigem apenas spt em grande parte de seus projetos. Então, é preciso ter em mente que investigações consolidadas ajudam a economizar milhões de reais, os quais, às vezes, são desperdiçados porque se queria economizar alguns milhares de reais”, finaliza.

Entrevistado
Engenheiro civil Fernando Schnaid, professor-doutor do programa de pós-graduação do departamento de engenharia civil da UFRGS, com especialidade em geotecnia e engenharia de fundações

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ppgec@ppgec.ufrgs.br

Crédito Fotos: Fifa

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

A um ano da Copa, Rússia está bem melhor que o Brasil

Apenas três dos doze estádios estão com cronogramas atrasados. Cinco serão concluídos até o final deste ano e quatro já estão prontos

Por: Altair Santos

Arena Kazan: estádio já existia e foi reformado para a Copa 2018
Arena Kazan: estádio já existia e foi reformado para a Copa 2018

Entre 17 de junho e 2 de julho, a Rússia vai sediar a Copa das Confederações. Trata-se de evento-teste para a Copa do Mundo 2018. Os quatro estádios que vão receber os jogos já estão prontos. Os russos terão que entregar mais 8 arenas até o final de 2017. Apenas 3 estão com os cronogramas atrasados e podem ser que fiquem prontas até o final do primeiro trimestre de 2018. Comparativamente ao Brasil, em 2014, a situação russa é melhor no que se refere ao calendário de obras. Porém, o país-sede do próximo mundial enfrenta um adversário natural: o inverno. Entre dezembro e fevereiro, as temperaturas podem chegar a 20 °C negativos, o que inviabiliza boa parte dos trabalhos.

Segundo o chefe do comitê organizador da Copa 2018, Alexei Sorokin, a meta é que, para o próximo inverno russo, fiquem pendentes apenas obras de acabamento interno nos estádios que não estiverem concluídos, o que a neve e o frio não atrapalhariam. Durante a primavera e o verão, as frentes de trabalho se esforçam para liberar a área dos campos e iniciar o plantio da grama, a fim de que os gramados estejam consolidados antes que o inverno chegue. A corrida contra o tempo é maior para concluir os estádios em Kaliningrado, Ekaterimburgo e o histórico Luzhniki, em Moscou. Esta obra está para a Rússia como o Maracanã para o Brasil. É um estádio da era stalinista, construído em 1956, e cujo projeto de retrofit preservou a fachada externa, mas obrigou a construção de uma nova arena na área interna.

Estádio olímpico de Sochi, construído para os jogos de inverno de 2014: pronto para a Copa
Estádio olímpico de Sochi, construído para os jogos de inverno de 2014: pronto para a Copa

Não é à toa que o Luzhniki tem o maior canteiro de obras e dois mil operários trabalhando para deixá-lo pronto até novembro. Atualmente, boa parte dos estádios inacabados na Rússia está na etapa da instalação das estruturas de aço para receber as coberturas. "Nossos preparativos estão indo muito bem. Muito melhor do que em alguns outros países que já receberam a Copa do Mundo", diz Alexei Sorokin, numa referência indireta ao Brasil. Além do Luzhniki, e dos estádios em Kaliningrado e Ekaterimburgo, também estão em obras as arenas nas seguintes cidades: Volgogrado, Rostov-on-Don, Saransk, Nizhny Novgorod e Samara. Confira como está o cronograma de obras dos 8 estádios ainda em construção, segundo o relatório de maio da Fifa:

Luzhniki: equipes de trabalho concentram-se no retrofit da área externa.
Ekaterinburgo: cobertura está na fase final e gramado será plantado em julho. Calçamento no entorno vai envolver área de 5.500 m².
Volgogrado: estrutura de aço que vai receber a cobertura está na fase final. As 21 torres de iluminação começaram a ser instaladas.
Rostov-on-Don: cobertura está 80% concluída e começaram as obras para colocação de escadas rolantes e elevadores, assim como as instalações hidrossanitárias.

Arena Spartak: após a Copa, será o estádio de um dos principais times da Rússia
Arena Spartak: após a Copa, será o estádio de um dos principais times da Rússia

Saransk: na reta final para a instalação das estruturas que receberão a cobertura.
Nizhny Novgorod: vai começar a instalação da cobertura, da colocação de cadeiras e do gramado, além das obras de mobilidade no entorno.
Samara: finalizada a parte de concretagem, começa a receber a cobertura e obras de acabamento.
Kaliningrado: instalação da cobertura está em curso e fachada externa está em construção.

Entrevistado
Alexei Sorokin, chefe do comitê organizador da Copa Fifa 2018 (via assessoria de imprensa)

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info@rfs.ru

 

 

Crédito Fotos: Fifa

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330

Doca de concreto flutuante substitui estrutura de aço

Peça tem longa durabilidade e custo menor, além de versatilidade. Primeiro estaleiro a usar estrutura inovadora está no Havaí

Por: Altair Santos

No Havaí, docas de concreto flutuante estão substituindo estruturas de aço nos estaleiros. Antes, essa solução era aplicada apenas para pequenos atracadouros. Porém, uma construtora da Cingapura - a GL Engineering & Construction Pte Ltd (GL E & C) - conseguiu desenvolver grandes peças para navios de até 9.500 toneladas. “Tivemos de explorar perspectivas de engenharia além dos conceitos convencionais de aplicação do concreto. Também foi preciso treinar mão de obra para atender as especificações de design e requisitos do projeto”, diz Lim Sing Tian, diretor-geral da GL Engineering & Construction Pte Ltd.

Rebocador transporta peça para o Havaí e chega no começo de junho ao destino
Rebocador transporta peça para o Havaí e chega no começo de junho ao destino

As megaestruturas podem receber três grandes embarcações de uma só vez. Possuem 15 metros de altura, 138 metros de comprimento e 46 metros de largura, com vão de 36 metros entre as paredes. Cada uma pesa 15 mil toneladas. Foram fabricadas com graute 85 (concreto de alta plasticidade) e consumiram 320 mil m³ de concreto cada uma. Segundo o construtor, as docas podem durar até 200 anos. “Temos a intenção de apresentar a funcionalidade destas estruturas aos estaleiros dos Estados Unidos e estamos convictos de que atrairão não apenas o mercado norte-americano como mundial”, afirma Lim Sing Tian.

A confiança de que as docas de concreto flutuante substituirão as de aço em um futuro breve tem a durabilidade como alicerce. No entender dos projetistas das grandes estruturas, trata-se de elementos com longa vida útil e menor volume de manutenção, o que torna seu custo mais barato - US$ 12 milhões cada uma. Comparativamente, as estruturas de aço são normalmente concebidas para uma vida útil de 20 anos e requerem manutenção regular e dispendiosa. Além da competitividade, as docas em concreto sustentável são versáteis. Podem ser usadas para a construção e a manutenção de navios.

Equipe de especialistas

Estrutura de concreto flutuante pode receber navios de até 9.500 toneladas
Estrutura de concreto flutuante pode receber navios de até 9.500 toneladas

A construção das imensas docas de concreto flutuante envolveu 500 pessoas, entre operários, designers, projetistas, laboratoristas, consultores em concreto e engenheiros civis. A primeira estrutura levou 13 meses para ficar pronta - começou a ser fabricada em março de 2016. O processo de construção se estendeu desde a montagem da fôrma do concreto, pensada para ter o desenho interno de favos de mel, até o revestimento. Após a conclusão da primeira doca, 120 air bags foram inflados para colocá-la ao mar. Essa estrutura está atualmente no caminho para o Havaí e a perspectiva é de que chegue ao estaleiro que a encomendou no começo de junho de 2017.

O sistema que usa concreto flutuante para a construção de docas não é novo. Porém, o material - até a inovação desenvolvida em Cingapura - era utilizado apenas em atracadouros para pequenas embarcações. Por outro lado, há pelo menos uma década vinha se tentando construir grandes estruturas de concreto flutuante, mas esbarrava-se em soluções como cofragem, a estrutura para sustentar as peças e especificação do concreto. Até que a GL Engineering & Construction encontrou as respostas que prometem revolucionar a engenharia naval.

Entrevistado
Lim Sing Tian, diretor-geral da GL Engineering & Construction Pte Ltd. (via assessoria de imprensa)

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enquiry@glec.com.sg

Crédito Fotos: GL E & C

Jornalista responsável: Altair Santos MTB 2330