27/07/2022

Equilíbrio em contratos de obras públicas: como fazer?

Documentos devem trazer matriz de riscos, além de prever flexibilidade em casos de grande magnitude como a pandemia

A matriz de riscos e responsabilidades deve ser feita desde o Edital, para que fiquem claros os parâmetros de equilíbrio econômico-financeiro.
Crédito: Envato

Os contratos públicos pressupõem, conforme seu regime constitucional, a manutenção das condições efetivas da proposta. Essa relação entre obrigações e remuneração é estabelecida na proposta contratada e é chamada de equilíbrio econômico-financeiro. No entanto, diante das muitas mudanças, pandemia, aumento de preço dos insumos e guerra, como reduzir os riscos dos contratos de obras públicas para que eles cumpram seus objetivos?

“No caso de ocorrerem eventos supervenientes à proposta, devem ser feitos ajustes que permitam que o contrato possa ser continuado e concluído conforme as condições iniciais”, explica Mariana Miraglia, sócia do escritório de advocacia Aroeira Salles e especialista em gestão de contratos e projetos.

Como reduzir os riscos de contratos de obras públicas?

De acordo com Mariana, há alguns mecanismos próprios do regime jurídico dos contratos públicos que vão permitir os ajustes necessários para que as obras cumpram seus objetivos na hipótese de sobrevirem a situações supervenientes e imprevisíveis como pandemia ou guerras, entre eles:

1.  Estabelecimento de matriz de riscos e responsabilidades entre as partes, desde o Edital, para que fiquem claros os parâmetros de equilíbrio econômico-financeiro; 

2. Alterações contratuais por acordo entre as partes para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em caso de força maior, caso fortuito ou fato do príncipe ou em decorrência de fatos imprevisíveis ou previsíveis de consequências incalculáveis, que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada, em qualquer caso, a repartição objetiva de risco estabelecida no contrato.

Novos contratos: como proceder?

Os novos contratos devem se atentar para prever mecanismos que devem ser analisados além da órbita jurídica, inclusive técnica, segundo Mariana. Para isso, é válido utilizar alguns mecanismos:

Estimular a operacionalização da definição objetiva da matriz de riscos, de forma a prezar sempre pela implementação da matriz de riscos.
– O aprimoramento dos projetos de obra pública com foco no planejamento.
– A atualização dos orçamentos de referência em conformidade com a realidade do mercado. Deve-se evitar realizar licitações, por exemplo, com defasagem do orçamento estimado.
Mecanismos de reajuste para preservação dos preços ao longo do tempo e mecanismos de revisões extraordinárias para operacionalizar compensações à parte afetada por um risco que foi atribuído pelo contrato à outra parte.
– Soluções simples e eficientes para compensar os contratados por desequilíbrios verificados como a adoção de indicadores que reflitam a evolução no preço de insumos específicos.
– Estabelecimento de métodos alternativos na solução de conflitos, como arbitragem, mediação ou comitê de resolução de disputas (dispute board), que possibilitam solucionar conflitos de forma mais célere e com maior aprofundamento das questões técnicas.

Ajustes em contratos em andamento

Em caso de contratos já estabelecidos, Mariana afirma que a lei prevê a hipótese de alteração contratual por acordo entre as partes para restabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro do Contrato Público. “São admitidas, ainda, modificações de projeto e especificações, de forma unilateral pela administração para adequação técnica do objeto, garantida a manutenção do equilíbrio econômico-financeiro. Além disso, o Contrato pode ter mecanismos de reajustamento ou repactuação, este último quando se trata de serviços contínuos”, pontua.

Cláusulas de risco imprevisível 

Com a pandemia, diversos efeitos foram sentidos no mercado da construção civil, especialmente no que concerne à mão-de-obra, prazos e recebimento de insumos. Portanto, na hora de planejar um contrato, é importante se atentar pela repartição objetiva de riscos entre as partes, uma vez que isso influencia o estabelecimento do equilíbrio econômico-financeiro

“Trata-se da matriz de riscos e responsabilidades dos contratos. O artigo 92 da Lei 14.133 de 2021 refere-se a essa matriz de risco. Essa alocação ou distribuição é um elemento ideal para o sucesso de projetos de obra pública, pois permite maior clareza na distribuição dos riscos e delimitação do equilíbrio contratual. Contudo, a matriz de risco é estimativa e é possível que outros riscos não previstos venham a se materializar. Para a Administração Pública não é recomendável que o particular assuma todo e qualquer risco imprevisível, pois isso faria com que os preços dos contratos se tornassem muito maiores para a proteção desses riscos desconhecidos. Ao invés disso, é recomendável atentar para a mutabilidade dos contratos públicos. As partes, de comum acordo, poderão alterar os contratos para restabelecer o equilíbrio econômico-financeiro inicial do contrato em decorrência de fatos imprevisíveis que inviabilizem a execução do contrato tal como pactuado, respeitada a repartição objetiva do risco”, explica Mariana.
 
Embora o risco imprevisível da magnitude que tivemos na pandemia, por exemplo, não esteja objetivamente alocado, existe a possibilidade de alteração contratual consensual para atender a mudanças contextuais inimagináveis e à maleabilidade da realidade. “Essas mutações contratuais visam à preservação do interesse público, princípio basilar do regime jurídico administrativo”, pontua Mariana.

Entrevistada
Mariana Miraglia é sócia do escritório de advocacia Aroeira Salles e especialista em gestão de contratos e projetos.

Contato
contato@aroeirasalles.com.br

Jornalista responsável
Marina Pastore
DRT 48378/SP


27/07/2022

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