Boas obras públicas começam pela licitação
Construtoras que se relacionam com a administração pública precisam ter amparo técnico para evitar pressões de organismos fiscalizadores.
Construtoras que se relacionam com a administração pública precisam ter amparo técnico para evitar pressões de organismos fiscalizadores
Por: Altair Santos
Não são raras as obras contratadas pelo poder público que acabam sofrendo atraso de cronograma ou, em casos extremos, ficam paralisadas e entram em colapso. Na maioria das vezes, não se trata de falta de recursos, mas de licitações mal feitas, resultando em contratos que depois precisam ser revistos ou que terminam em processos judiciais. Para evitar problemas, os projetos hoje necessitam atender a uma série de requisitos técnicos e legais, com orçamentos e serviços que reflitam os preços de mercado. Tudo isso tem que estar embutido nos editais e ser bem interpretado pelas construtoras, através de equipes técnicas preparadas. É o que ensina o professor Luciano Elias Reis na entrevista a seguir. Confira:
Boas obras começam pela licitação?
Não existe a menor dúvida de que sem uma boa licitação não existe boa obra pública. A licitação não é somente a fase externa, ou seja, quando o edital é publicado. A licitação divide-se em fase interna e fase externa. A fase interna da licitação, a qual é imprescindível para a confecção do edital e de seus anexos, dentre eles o projeto básico e executivo, é simplesmente esquecida e muitas vezes suprida ou amadurecida precocemente por suposta “pressa ao interesse público” ou também conhecida como “as licitações para ontem”.
O que uma construtora que entra numa licitação precisa atender?
A construtora precisa atender todos os documentos de habilitação, manter a documentação de habilitação durante toda a execução do contrato e ter uma boa equipe técnica para relacionar-se e comunicar-se com a administração pública. Quando se fala em relacionamento e comunicação das empreiteiras com a administração pública, infelizmente a falta deste preparo e qualificação é fator de elevado risco para prejuízos materiais. Por exemplo, a ausência da formalização de um pedido de reequilíbrio ou de entrega de uma fatura pode, e provavelmente vai, gerar um erro no termo inicial de infração contratual, ausência de materialização e provas. Percebe-se que as empreiteiras que estão bem assessoradas ganham muito mais dinheiro a médio e longo prazo. Este é o caminho. Não pode o engenheiro ou dono da empresa achar que leu a lei n.º 8.666 (lei de licitações) e saber de todos os seus pormenores. A lei precisa ser interpretada pelo poder judiciário e pelos cortes de contas. É necessário pensar numa ótima equipe para alcançar ótimos resultados, pois do contrário, às vezes a empresa estará ganhando cem e deixando de faturar cem mil.
Há uma espécie de dez mandamentos para se entrar em uma licitação?
Quanto aos mandamentos para participar de licitação, depende do público-alvo para falar dos dez mandamentos. Em síntese, pode-se dizer que o primeiro mandamento para entrar em licitação é saber como é uma licitação e quais são as características e peculiaridades de um contrato administrativo. Muitos se aventuram em licitações e depois se decepcionam. Para entrar no ramo de licitação, como dito anteriormente, é imperioso que haja qualificação, preparação e treinamento, por que do contrário não haverá resultados positivos e talvez o ramo de licitações se transforme num grande problema a médio e longo prazo.
Um bom projeto e uma licitação transparente permitem que uma obra tenha quanto em economia de tempo e de dinheiro?
Para acontecer economia de tempo e de dinheiro, não basta um excelente projeto e a boa condução do processo licitatório. É preciso que haja uma fiscalização árdua sobre o contrato administrativo. Várias empreiteiras já estão sentindo o impacto da melhor qualificação dos fiscais de contratos administrativos no dia a dia das obras públicas. Esta qualificação decorre da pressão que os tribunais de contas estão realizando sobre a administração pública, inclusive com a penalização de agentes públicos, para fiscalizar corretamente os contratos e penalizar as empresas que infringirem a lei e o contrato.
Hoje, com a quantidade de organismos fiscalizadores existentes, por que ainda ocorrem processos licitatórios defeituosos?
Grande parte dos vícios nas licitações e nos contratos administrativos decorre da falta de capacitação e treinamento dos agentes públicos. Muitas vezes, a administração pública não dá condições adequadas para o agente público desenvolver a sua função. Da mesma forma, existem várias mudanças de interpretação, legislação e critérios, os quais clamam pela constante atualização dos servidores públicos. Infelizmente, nem sempre existe programa de capacitação e treinamento adequado aos agentes públicos, o que por si só contribui e auxilia nas licitações defeituosas, fiscalizações inadequadas, obras paradas etc.
Os chamados aditivos da obra, que ocorrem após uma empresa ganhar uma licitação, podem ser considerados vícios de uma má licitação?
Não necessariamente. Tem aditivo que é necessário em razão de mudanças ocorridas após a licitação, os quais decorrem de fatos supervenientes à licitação. Porém, existem várias alterações de contratos que decorrem de falha na fase interna da licitação, mais precisamente quando da elaboração do projeto. Ou seja, usam os aditivos para consertar erros e muitas vezes simplesmente deturpam ou transfiguram o projeto inicial. Em outras palavras, alteram substancialmente o projeto inicialmente proposto. Tudo isso deve ser evitado pela correta fase interna da licitação e com pessoas qualificadas e capacitadas.
Ao ganhar uma licitação, que cuidados uma construtora deve tomar para evitar que a licitação se torne um fardo?
A construtora precisa ter a devida assessoria para saber no que está entrando, como deve entrar e se portar no mercado das licitações e contratos administrativos para evitar processos judiciais. Processos judiciais, dependendo do caso, podem significar grave risco à saúde financeira de uma empresa que trabalha com licitações, haja visto o grande tempo para a finalização deste processo.
As construtoras têm procurado se especializar nos trâmites de uma licitação? Normalmente, dentro da empresa, quem cuida disso?
Como disse, a equipe de licitação de uma construtora tem que ser multidisciplinar e ter, no mínimo, um técnico de licitação, um analista de licitação, um advogado, um engenheiro e um orçamentista. Esta é uma equipe enxuta para que cada um faça o seu papel muito bem feito.
Quem atua em licitações tem se atualizado sobre as alterações promovidas pela IN (Instrução Normativa) 01/10, pertinentes às exigências de sustentabilidade? Quais são as principais mudanças?
Infelizmente, na parte do setor privado é muito falha a atualização sobre a Instrução Normativa n.º 01/2010, e de outras medidas que têm sido adotadas e inseridas nos editais de licitação. A falha na atualização será sentida no faturamento. Não há dúvidas disso. Preparação, treinamento e boa qualificação são ingredientes de sucesso em qualquer empreitada.
Entrevistado
Luciano Elias Reis, presidente da comissão de gestão pública e controle da administração da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná
Currículo
– Luciano Elias Reis é graduado em direito, sócio do escritório Reis, Correa e Lippmann Advogados Associados
– Tem mestrado em direito econômico pela PUC-PR e especialidade em processo civil e em direito administrativo, ambos pelo Instituto de Direito Romeu Felipe Bacellar. Preside a comissão de gestão pública e controle da administração da Ordem dos Advogados do Brasil – Seção Paraná
– É professor de direito administrativo da UniCuritiba, professor convidado da pós-graduação em licitações e contratos administrativos da Unibrasil, professor da Escola Superior da Advocacia da OAB-PR, professor do MBA em administração pública e gerência de cidades da FATEC Internacional
– É autor de diversos artigos jurídicos e coautor da obra “Estado, Direito e Sociedade” (Editora Iglu).
Contato: luciano@rcl.adv.br
Créditos fotos: Divulgação
Jornalista responsável: Altair Santos – MTB 2330
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